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Uma resposta eficiente

22 abril, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“Tem-se a impressão de que a esquerda está imobilizada, no nível da teoria e por conseguinte no da prática, pela ideia de que deve ficar o tempo todo revolvendo as entranhas do presente em busca de sinais de catástrofe e salvação”.

Ekaterina Panikanova

Por uma esquerda sem futuro, do historiador e crítico de arte marxista britânico T. J. Clark, analisa a encruzilhada em que se encontra a esquerda, incapaz até agora de propor respostas à crise econômica e social deste início de século XXI. O ensaio foi originalmente publicado na “New Left Review” – periódico sobre política fundado na década de 1960 – e pensa a utopia e o pragmatismo no pensamento de esquerda, defendendo que a esquerda deve reinventar sua resistência através do combate à desigualdade e à injustiça social, não através de ideias utópicos. Segundo ele, se a esquerda quiser permanecer existindo como geradora de ideais políticos relevantes, deve realizar uma revisão dos totalitarismos do passado e renunciar, nesta era de consumo e crescimento insustentáveis, a toda noção messiânica de futuro. 

Fernando Gabeira, em artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo, analisa: “[…] uma esquerda sem futuro. T. J. Clark não se refere a ela como força em via de desaparecer. O “sem futuro” significa abrir mão de ter um script para a História, de prometer amanhãs que cantam paraísos na Terra e mergulhar no presente, aceitando até mesmo quem não tem pretensões de encarnar uma vanguarda”. Para ele, o objetivo o autor seria “apenas reunir material para uma sociedade, expressão que Clark utiliza para contrapor a uma frase de Friedrich Nietzsche em que o filósofo alemão afirma que perdemos as condições de matéria-prima para uma sociedade”. Gabeira analisa a questão à luz da situação brasileira.

Como bem resume Antonio Gonçalves Filho, em artigo também publicado no Estadão, “o que preocupa Clark é a marginalização e a imobilidade da esquerda na Europa. […] Para Clark, a crise não é só da esquerda, mas da modernidade, que ingenuamente acreditou no “capitalismo de consumo”, erro “infantil” que, segundo o historiador, tem levado os intelectuais de esquerda a perder o foco e mirar o futuro com esperança messiânica, acreditando ainda ter a história uma lógica ou direção. O “sem futuro” do título de seu livro é, assim, simultaneamente, uma crítica e uma convocação à esquerda para que repense o presente e se importe menos com a tomada do poder num futuro remoto”.

O livro foi lançado pela editora 34, com tradução de José Viegas e prefácio à edição brasileira escrita pelo próprio autor.

No Brasil, T. J. Clark tem vários livros traduzidos e publicados, entre eles A Pintura da Vida Moderna [Companhia das Letras] e Modernismos [Cosacnaify]. Arte e política são os dois assuntos mais trabalhados pelo historiador, o professor aposentado de Harvard e Berkeley. Aos 70 anos, ainda não desistiu de sua fama de polêmico.

A uma pergunta simplista – “A esquerda morreu?” –, em uma entrevista feita por ocasião de sua participação na Flip no ano passado, ele respondeu: “Não acho que a esquerda tenha morrido. Não quero também pensar a esquerda como uma coisa única, uma espécie de organismo. Acho que a esquerda é uma tradição, com determinadas posturas e atitudes, e acho que essa tradição está com problemas, ela tem sido por muitos anos irrelevante e apartada da realidade, e tem fracassado em mobilizar as pessoas, mesmo quando elas vivem um momento de crise e insatisfação como o atual”. Em Paraty, Clark proferiu uma palestra sobre o conteúdo político do quadro Guernica de Picasso – grande especialista na obra do pintor, ele é autor de um livro fundamental sobre ela, Picasso and Truth, inédito no Brasil.

 

 

 

POR UMA ESQUERDA SEM FUTURO

Autor: T. J. Clark
Editora: 34
Preço: R$ 20,30 (80 págs.)

 

 

 

 

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