matraca

Não espere nenhuma resposta

21 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Walter Benjamin cita, em uma passagem do texto “Que é o teatro épico?”, a seguinte análise de Bertold Brecht: “O fato de que o homem pode ser conhecido de determinado modo engendra um sentimento de triunfo, e também o fato de que ele não pode ser conhecido inteiramente, nem definitivamente, mas é algo que não é facilmente esgotável, e contém em si muitas possibilidades (daí sua capacidade de conhecimento) é um sentimento agradável”. A respeito dessa análise, Benjamin conclui: “Quando o fluxo da vida é repassado, imobilizando-se, essa interrupção é vivida como se fosse um refluxo: o assombro é esse refluxo. […] Mas, se a torrente das coisas se quebra no rochedo do assombro, não existe nenhum diferença entre uma vida humana e uma palavra”.

Brecht conseguiu conferir uma instância moral ao palco, articulá-lo às condições reais do corpo social, com assombro. Em suas poesias, menos comentadas do que suas peças, Brecht também desvela situações com a veemência de seu pensamento crítico e com sua ironia desmistificadora. Sua poesia, assim como seu teatro, é, a um só tempo, “lírica e política”, para usar novamente as palavras de Walter Benjamin.

A editora 34 é responsável pela publicação da mais importante antologia da poesia de Brecht no Brasil. Nesta edição, revista, há 260 poemas reunidos escritos entre 1913 e 1956, dentre os quais há baladas, sátiras, canções e exortações à luta, além de uma cronologia da vida e das obras de Brecht. A coletânea, organizada e traduzida por Paulo César de Souza, preserva momentos prodigiosos da poesia brechtiana, de representativa originalidade pelo tom ríspido e desprezo aos convencionalismos líricos. A seleção prioriza os poemas curtos, impactantes, políticos, alguns beirando o poema-piada, por seu humor cortante.

 

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Você diz:

Nossa causa vai mal.

A escuridão aumenta. As forças diminuem.

Agora, depois que trabalhamos por tanto tempo

Estamos em situação pior que no início.

 

Mas o inimigo está aí, mais forte do que nunca.

Sua força parece ter crescido. Ficou com aparência de invencível.

Mas nós cometemos erros, não há como negar.

Nosso número se reduz. Nossas palavras de ordem

Estão em desordem. O inimigo

Distorceu muitas de nossas palavras

Até ficarem irreconhecíveis.

 

Daquilo que dissemos, o que é agora falso:

Tudo ou alguma coisa?

Com quem contamos ainda? Somos o que restou, lançados fora

Da corrente viva? Ficaremos para trás

Por ninguém compreendidos e a ninguém compreendendo?

 

Precisamos ter sorte?

 

Isto você pergunta. Não espere

Nenhuma resposta senão a sua.

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POEMAS 1913-1956

Autor: Bertold Brecht
Editora: 34
Preço: R$ 37,80 (360 págs.)

 

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