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História dos crimes e da violência no Brasil

31 janeiro, 2018 | Por Isabela Gaglianone

Batalha entre Lápidas e Centauros, Peter Paul Rubens, 1608 – 1610 [Rijks Museum]

História dos crimes e da violência no Brasil, coletânea organizada pelas historiadoras Mary Del Priore e Angélica Müller, acaba de ser lançada pela Editora Unesp. Trata-se de uma reunião de ensaios e artigos, escritos por autores de diversas áreas, que buscam compreender os mecanismos de propulsão da violência, em suas variadas manifestações, no Brasil.

As organizadoras perguntam: “Em nossa sociedade, cresce a violência ou nossa sensibilidade em relação a ela?”. Em torno desta indagação, o livro compõe um mosaico histórico, que convida à reflexão sobre sobre as formas de infrações que permeiam nosso cotidiano, sobre os crimes e violências presentes em nossa sociedade, praticados de variados modos e em diversas esferas.

Para as organizadoras, o bombardeio constante dos meios de comunicação a respeito da violência ou mesmo a vivência pessoal de cada um, imerso, de seu próprio jeito, na violência diária, não explicam as suas raízes. Para tentar compreender mais profundamente este obscuro universo, este volume surge, com o intuito de fornecer ferramentas para refletirmos sobre a permanência da violência e suas diversas faces. Del Priore e Müller, no prefácio, apontam que “vários autores se reuniram para tentar definir um conjunto de fenômenos de violência físicas, sexuais, verbais e para tentar entender os mecanismos que os colocam em marcha […] historiadores, sociólogos, juristas, antropólogos e psicólogos apresentam vários casos ocorridos em nosso território ao longo dos séculos. O fio condutor está centrado na ideia de como o crime e o emprego da violência fizeram e fazem parte de nossa sociedade”.

Ao longo dos ensaios e artigos, as noções de crime ou violência são trabalhadas e expandidas em terminologias maiores. “A violência está sendo considerada como força exercida por uma pessoa, um grupo, um Estado com o intuito de forçar alguém/algo para conseguir alguma coisa. Violência e crime são mais que sinônimos: são estágios diferentes, e às vezes complementares, de um mesmo processo”, escrevem as organizadoras. Segundo elas, o objetivo da publicação foi “convidar para a reflexão sobre as formas de infrações que fizeram e fazem parte de nosso cotidiano, na esperança de que nossa sociedade encontre novas formas de tolerância, convivência e solidariedade”. A violência está presente física, verbal, sexual, psicologicamente, na família, no grupo: “A violência se declina de mil maneiras”, nas palavras de Mary Del Priori.

Onipresente e proteiforme, será, a violência, natural, ou cultural? Os artigos reunidos recontam a história do Brasil, desde o início da colonização até hoje. Aborda-se o papel da televisão, por exemplo, quer no jornalismo televisivo que traz o crime para o primeiro plano, de maneira sensacionalista, ou no entretenimento baseado na exploração da violência e que exige que se suspenda a própria moral para desfrutá-lo – quando vemos algo violento, nossa ética fica em suspenso, para poder aceitar a violência assistida: nosso código moral, nossa resiliência frente à violência, vai sendo construída socialmente. Os artigos ainda versam sobre a noção que perdurou no Brasil sobre “a honra e a pureza” da mulher como justificativa histórica para violência extrema; a persistente violência contra os índios; a violência da escravidão mantida pela divisão entre senhores e escravos; crimes cometidos em nome de intolerâncias religiosas, sobretudo contra religiões de matriz africana; a questão das prisões no Brasil, que põe em cheque os direitos humanos: nossa história pode bem ser contada pela violência.

Um ponto, nevrálgico, levantado no livro e que não deixa espaço para respostas fechadas, é a reinvenção cotidiana da violência. Assistimos a cada vez mais novas formas de violência, sobretudo as que ocorrem graças à internet, como linchamentos graças às chamadas redes sociais. Não apenas no Brasil, o maniqueísmo no mundo parece cada vez mais forte, gerando intolerância.

No presente brasileiro, vemos as declinações da violência desde o Congresso Nacional, de onde se constantemente perpetuam formas de violência ao cidadão, às capitais onde se faz necessária a intervenção das forças armadas, passando pelas violências que, de tão cotidianas, passam mesmo despercebidas, mas provam vivermos em país homofóbico, racista e machista. A violência, no Brasil, foi naturalizada, tornou-se parte constitutiva de nossa sociedade.

O que você faz para combater a violência que permeia o seu cotidiano?

 

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HISTÓRIA DOS CRIMES E DA VIOLÊNCIA NO BRASIL

Autor: Mary Del Priore e Angélica Müller (orgs.)
Editora: Unesp
(485 págs.)

 

 

 

 

 

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