matraca

В озере моих слов – Nas águas das minhas palavras

2 julho, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Velimir Khlébnikov por Burliuk

O poeta russo Velimir Khlébnikov (1885-1922), foi, segundo Roman Jakobson, um dos mais inventivos autores do século XX. Khlébnikov foi mentor da vanguarda cubo-futurista e criou a linguagem zaúm, ou transmental, que é formada por sons abstratos. Seu trabalho exerceu forte influência na obra de Vladimir Maiákovski e em todo o movimento vanguardista da poesia russa.

A editora Bem-te-vi acaba de lançou recentemente a coletânea Eu e a Rússia, com textos escritos entre 1908 e 1922, selecionados e traduzidos por Marco Lucchesi, poeta, romancista, tradutor e professor de Literatura da UFRJ. A publicação é uma versão revista e ampliada de um pequeno livro independente lançado nos anos 1980.

O volume traz poemas que abordam os principais temas do autor: a curiosidade pelo espaço geográfico, o encanto com a cultura do Oriente, a paixão pela língua – expressa na exploração das raízes das palavras e de sua etimologia e na criação de neologismos. São poemas que revelam uma evolução poética a partir das origens simbolistas de Khliébnikov.

O livro conta ainda com nota biográfica e análise estilística da obra de Khliébnikov, assinadas pelo tradutor Marco Lucchesi, bem como uma apreciação sobre a presença de Khliébnikov no Brasil, pelo especialista em literatura russa, Valerii Bossenko. Além de uma entrevista realizada por Zóia Prestes com Lucchesi, sobre o ofício da tradução, e uma bibliografia selecionada. A publicação pretende oferecer, para além da tradução de um poeta muitas vezes citado como intraduzível, uma conceituação e discussão da arte da tradução.

No Brasil, vários de seus poemas foram traduzidos por Augusto e Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman, publicados na antologia Poesia Russa Modernaalém da prosa de ficção Ka,traduzida por Aurora Bernardini.

Graças à censura estética stalinista, o nome de Vielimir Khlébnikov foi omitido dos cânones literários. Apenas em 1928 suas obras completas foram publicadas, em cinco volumes e, atualmente, é reconhecido como um dos principais renovadores da literatura russa.

Segundo Boris Schnaiderman, no prefácio escrito ao livro Poesia Russa Moderna, a “obra anunciadora de Velimir Khlébnikov, não se parecia com nada do que se fizera anteriormente. Anulavam-se não só os clichês introduzidos pelo simbolismo, mas toda a linguagem convencional se desarticulava. Sua poesia parecia às vezes não ter sentido, mas, na realidade, o que ele trazia, na feliz expressão de Iúri Tinianov, era “um novo sistema semântico”. Ela só não tinha sentido para quem não conseguia apreendê-lo, nem perceber nele o verdadeiro significado dos novos tempos”. 

_____________

O lavrador, abandonando a enxada,

Contempla o voo de um corvo

E diz: em sua voz ressoa

A Guerra de Troia,

A ira de Aquiles,

O pranto de Hécuba,

enquanto voa

sobre nossas cabeças.

Na mesa empoeirada

O acaso criou na poeira

Seus estranhos desenhos.

Diz um menino curioso:

Essa poeira talvez é Moscou

E essa talvez é Chicago ou Pequim.

A rede de um pescador

Entrama as capitais da Terra

Nos laços da poeira,

Nas malhas dessa melodia.

E a noiva não desejando

Manter a poeira das unhas

afirma ao limpá-las:

Esplendem na poeira

Vivos Sóis e tantos mundos

De todo inatingíveis,

Fechados na matéria fria.

E Sirius resplandece sob as unhas

Rompendo com seu brilho a escuridão.

(Tradução de Marco Lucchesi)

_____________

 

EU E A RÚSSIA

Autor: Vielimir Khlébnikov
Editora: Bem-te-vi
Preço: R$ 35,00 (80 págs.)

 

*A título de nota, incluímos aqui também um poema de Khlébnikov traduzido por Haroldo de Campos, escrito em 1910, “A encantação pelo riso”:

Ride, ridentes!

Derride, derridentes!

Risonhai aos risos, rimente risandai!

Derride sorrimente!

Risos sobrerrisos – risadas de sorrideiros risores!

Hílare esrir, risos de sobrerridores riseiros!

Sorrisonhos, risonhos,

Sorride, ridiculai, risando, risantes,

Hilariando, riando,

Ride, ridentes!

Derride, derridentes!

 

Send to Kindle

Comentários