No livro Ontologia histórica o filósofo canadense Ian Hacking, partindo da arqueologia do saber de Foucault, desenvolve um raciocínio contundente a uma compreensão do mundo contemporâneo que une, na mesma raiz, fenômenos distintos como abuso infantil e posterior desenvolvimento emocional, traumas de doenças mentais transitórias, o papel da linguagem, da verdade e da razão na apreensão da realidade. Através do conceito de ontologia história, o autor sugere novos modos para que a filosofia possa utilizar a história e, em especial, como ele próprio faz uso da obra arqueológica inicial de Foucault, que, segundo diz, “é uma fonte quase infinita de inspiração”.
Traduzido do inglês por Leila Mendes e publicado no Brasil pela editora da universidade Unisinos, o livro é uma reunião de palestras, artigos e ensaios escritos entre 1973 e 1999. O texto do primeiro capítulo, cujo título dá nome ao livro, foi escrito por ocasião de uma palestra que Ian Hacking foi convidado a proferir, no Departamento de História da Ciência na Universidade de Harvard, a respeito de interconexões entre história e filosofia. Nele, o autor amarra os temas que apresentará nos capítulos subsequentes baseando o cerne de sua tese na expressão de Foucault: “ontologia histórica de nós mesmos”, do ensaio O que é o iluminismo?; segundo Ian Hacking, Foucault teria considerado este o título de um estudo que dissesse respeito à “verdade por meio da qual constituímos a nós mesmos como objetos de conhecimento”, ao “poder por meio do qual constituímos a nós mesmo como sujeitos que agem sobre outrem”, e à “ética por meio da qual constituímos a nós mesmo como sujeitos morais”.
Seguindo esses três eixos, de conhecimento, poder e ética, Hacking pensa modos possíveis de ser uma pessoa, de criar uma história, de seguir preceitos morais, ou seja, “Uma certa mistura de história e filosofia pode, no entanto, mostrar como possibilidades vieram a existir, criando, como fizeram, novas charadas, confusões, paradoxos e oportunidades para o bem e para o mal”. O filósofo defende a existência de diferentes estilos de raciocínio, muitos dos quais são discerníveis em nossa própria história, do que conclui que muitas possibilidades do que pode ser verdadeiro ou falso dependem de eventos históricos, ou seja, do desenvolvimento de certos estilos de raciocínio. Uma ontologia portanto historicamente enraizada, o conduz neste exame da criação dos fenômenos, das personas e estilos de pensar. Segundo ele, “As proposições não têm uma existência independente do modo de raciocinar para chegar a elas”.
ONTOLOGIA HISTÓRICA
Autor: Ian Hacking
Editora: Unisinos
(306 págs.)