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A arte genuína de Julio Ramón Ribeyro

6 novembro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

Julio_Ramon_RibeyroSem ter sido um fumante precoce, a partir de certo momento minha história se confunde com a história de meus cigarros”.

Nas palavras de Julio Ramón Ribeyro, no fundo de suas histórias estão “a velhice, a deterioração, a frustração e o perecimento”. Considerado um dos maiores contistas de língua espanhola, sobretudo pelos conterrâneos Mario Vargas Llosa e Alfredo Bryce Echenique, Ribeyro dedicou-se também a escrita de ensaios, biografias e aforismos, mas foi principalmente nos contos que desenvolveu sua arte. No Brasil, a edição cuidadosa da Cosacnaify, Só para fumantes, traz uma breve mas significativa antologia composta por treze de seus contos, selecionados e traduzidos por Laura Janina Hosiasson. Selecionado como prólogo, o texto crítico escrito por Alfredo Bryce Echenique – “A arte genuína de Julio Ramón Ribeyro” – analisa: “Por uma espécie de duplo interno da fábula, em vários desses contos de fato ocorre uma segunda instância da significação. O indivíduo socialmente desamparado encontra um novo amparo no discurso que o substitui. Dir-se-ia então que o sujeito do drama do subdesenvolvimento ou da modernização desigual pode perder tudo, exceto essa capacidade piedosa de recuperar sua humanidade na imaginação. Isso torna mais aguda a crítica, evidentemente, mas também a fábula, que na verdade implícita da ficção sustém a frágil verdade do sujeito iludido”.

Uma fábula do fantástico, coexistente à representação fiel do sujeito no labirinto social, através da descrição de detalhes que revelam gestos tipificados, faz a característica ambiguidade da prosa de Ribeyro, que a torna tão dificilmente classificável. Prosa urbana, crítica social satírica, fábulas de ilusões e de sua latente brutalidade, pela própria condição ilusória – as compensações imaginárias. Não há uma leitura suficientemente abrangente para os seus contos, uma escolha interpretativa necessariamente sombreia ou ofusca outras. Suas narrativas são comumente associadas a Tchekhov – pelo tom, pela intensidade, pelas incursões íntimas e profundas – e Maupassant – pela técnica, pela variedade episódica –, dois autores que lhe eram caros. Sua principal preocupação temática, numa das passagens de seu diário pode ser brevemente identificada: “O que me fascina é a outra face da moeda: aquilo que deixei de fazer, que não teve eco, que fracassou”. Porém, conforme analisa a tradutora no posfácio, a construção de seus contos ultrapassa a contingência temática, abarcando o próprio processo visceral da relação da criatividade artística com a razão.

O conto que empresta o título ao livro, “Só para fumantes”, é simbólico nesse sentido, por mostrar a condição criativa do homem no mundo, a interpenetração – talvez irônica – do lúdico no cotidiano; mostra a relação necessária entre sujeito e imaginação, que perpassa a essência da criação poética: o contato do sujeito com o mundo depende de sua subjetividade imaginativa. “Não sabia que iria embora do Peru e que me aguardava uma existência errante na qual o cigarro, sua privação e sua abundância, pautariam meus dias com gratificações e desastres”.

SÓ PARA FUMANTES
Autor: Julio Ramón Ribeyro
Editora: Cosacnaify
Preço: R$ 35,70 (304 págs.)

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