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Música epistolar

6 agosto, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Igor Stravinsky e Jocy de Oliveira

A pianista e compositora Jocy de Oliveira lança hoje em São Paulo seu livro Diálogos com cartas, composto por um conjunto de cento e doze cartas, recebidas por ela ao longo de quarenta anos. Uma correspondência preciosa, pois testemunho vivo da exposição de ideias, vivências e realizações de alguns dos maiores músicos eruditos do século XX. São cartas de Igor Stravinsky, Robert Craft, John Cage, Luciano Berio, Karlheinz Stockhausen, Iannis Xenakis, Eleazar de Carvalho, Claudio Santoro, Lukas Foss, Robert Craft e Olivier Messiaen, trocadas ao longo de décadas com a pianista. Além das cartas em fac-símile, o livro reproduz algumas primeiras versões de partituras manuscritas e não editadas. Esse raríssimo material é inteiramente originário do acervo pessoal de Jocy de Oliveira, que ao longo do livro contextualiza os fatos mencionados e explica circunstâncias, comenta as cartas, de modo a oferecer ao leitor um panorama interessante e completo de sua vivência artística e pessoal junto a esses compositores. Jocy, que foi solista em duas ocasiões sob a batuta de Stravinsky, recebeu, na qualidade de pianista e amiga, peças especialmente escritas para ela por compositores como Berio, Cage, Xenakis e Santoro. Como pianista, ela gravou para os selos Vox e Polygram dos EUA, grande parte da obra de Messiaen.

O lançamento em São Paulo ocorrerá hoje, na Livraria Cultura do Shopping Iguatemi, às 19h30. O livro terá também uma edição na França publicada pela Honoré Champion.

Em entrevista, Jocy de Oliveira disse: “A ideia desse livro foi amadurecendo durante alguns anos. ˙Há cinco anos tive um prêmio bolsa da Rockefeller   Foundation  para um período em residência nesta Fundação em Bellagio Itália. Levei para lá xerox de duzentas cartas escritas para mim por alguns dos maiores compositores  da segunda metade do século XX. Foram personagens com quem convivi e trabalhei. Uma extraordinária oportunidade naquela época, para uma jovem da minha idade. Iniciei então um processo de seleção, análise, anotando comentários, observações e acrescentando informações relevantes e pertinentes às circunstâncias que as motivaram. Pouco a pouco o livro foi tomando forma e escolhi abordar 10 entre os mais proeminentes artistas  daquele período tais como: Stravinsky, Messiaen, Luciano Berio, John Cage, Robert Craft, I Xenakis, Stockhausen, Claudio Santoro, Eleazar de Carvalho e Lukas Foss. O livro portanto  aborda um material inédito  e baseado em fonte primária”.

Ao longo da vida, Jocy de Oliveira, hoje com 78 anos, desenvolveu uma atução ampla como pianista e compositora, tendo sido pioneira das artes multimídia no país, além de autora de oito óperas, de obras para orquestra e para formações de câmara, bem como obras para meios eletroacústicos.

Como compositora, ela desenvolve um trabalho musical direcionado à reformulação do sentido tradicional da ópera. Compôs, roteirizou e dirigiu suas oito óperas, que já foram apresentadas em diferentes países. Recebeu vários prêmios como: Guggenheim Foundation, Rockfeller Foundation (1983 e 2007), Bogliasco Foundation, CAPS, do New York Council on the Arts, Fundação Vitae, RioArte, sendo  também membro da Academia Brasileira de Música. Em 2007 o Festival Internacional de Campos do Jordão-SP, homenageou seu obra programando várias de suas peças (ópera, concerto de câmera, peça para soprano e orquestra de cordas). Em 2008, lançou uma edição organizada em caixa com quatro DVDs compilando suas seis óperas, com distribuição internacional pela NAXOS Video Library. Em 2010, seu espetáculo de música-teatro “Revisitando Stravinsky” estreou no SESC São Paulo e no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e, em 2011, foi lançado em DVD com distribuição internacional pela NAXOS Video Library. Em 2012 seu espetáculo de música- teatro “Berio sem censura” estreou no SESC, São Paulo e Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Ainda em 2012, a Radio France, Paris,  apresentou um perfil de sua  trajetória e obra em dois programas exclusivos de uma hora cada irradiados em horário nobre. Sua nova ópera multimídia “Liquid Voices” em progresso, deverá estrear em Basel, na Suíça, em abril de 2015.

Ao todo, como pianista e compositora gravou 22 discos no Brasil, Inglaterra, EUA, Alemanha e no México.

Diálogo com cartas, além da riqueza histórico-musical que traz ao mostrar peças, que viriam a tornar-se célebres, em pleno desenvolvimento primordial, revela também momentos pessoais, tocantes e inclusive bem-humorados.O livro revela curiosidades de histórias de bastidores, como o fato de que Stravinsky gostava de iniciar o dia com uma taça de champanhe Veuve Clicquot. O capítulo sobre Stravinsky é longo, narra também uma visita dele a um terreiro de macumba e comentários sobre a cidade. Sobre o maetro Eleazar de Carvalho (1912-1996), com quem Jocy viveu por 14 anos e teve um filho, há passagens que ilustram seu caráter intempestivo. De Luciano Berio e a relação, tanto artística como amorosa, que mantiveram por dez anos, surgiu a peça “Apague meu spotlight”, que, montada em 1961 com o Teatro dos Sete, encabeçado por Fernanda Montenegro, Ítalo Rossi e Sergio Britto, foi encenada no Teatro Municipal, sob a direção de Gianni Ratto. Segundo Jocy, foi a primeira apresentação de música eletrônica no Brasil.

 

DIÁLOGOS COM CARTAS

Autor: Jocy de Oliveira
Editora: Sesi
Preço: R$ 96,00 (444 págs.)

 

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