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Os cinco paradoxos da modernidade

14 outubro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

Em vez dessas pseudo-reviravoltas ou dessa galeria de figuras exemplares, deveríamos fazer uma história paradoxal da tradição moderna, concebida como uma narrativa esburacada, uma crônica intermitente. Possivelmente a face oculta de cada modernidade seja justamente a mais importante: as aporias e as antinomias extraídas das narrativas ortodoxas.
– Antoine Compagnon

[domínio público]

Édouard Manet, “Le déjeuner sur l’herbe” [1862-1863], Museu d’Orsay, Paris.

A “tradição moderna” de que fala Antoine Compagnon seria absurda, pois seria uma tradição feita de rupturas: na medida em que cada geração rompe com o passado, a ruptura em si torna-se tradição. O autor inicia sua análise a partir de uma citação de Octavio Paz, segundo quem a “tradição moderna” é uma aporia, um impasse lógico, uma tradição voltada contra si mesma, que ao mesmo tempo afirma e nega a arte, que decreta, simultaneamente, sua vida e sua morte. A tradição moderna seria então tradição da negação, consequência do reconhecimento do novo como valor.

A “crônica intermitente” da tradição moderna passa pelo que Compagnon aponta como Os cinco paradoxos da modernidade: a superstição do novo; a religião do futuro; a mania teórica; o apelo à cultura de massa; por fim, a paixão da negação. A cada um desses paradoxos da estética do novo corresponderia, respectivamente, um momento de crise da dita tradição: 1863, ano em que Manet pintou os quadros “O almoço na relva” [Le Déjeneur sur l’Herbe] e “Olympia” – momento que Compagnon também data simplesmente como contemporâneo de Baudelaire; 1913, com as colagens de Picasso e Braque, os caligramas de Apollinaire, os ready-made de Duchamp, os primeiros quadros abstratos de Kandinsky e A la recherche du temps perdu de Proust; 1924, data do primeiro Manifesto do Surrealismo, corresponderia à mania teórica; da guerra fria a 1968, corresponde ao apelo à cultura de massa e da relação da arte com o mercado através da pop art e da atuação de artistas como Andy Warhol, Jasper Jones, Rauschenberg; a quinta crise, correspondente ao quinto paradoxo, seria datada a partir dos anos 80, em que a consciência do moderno teria se tornado mais aguda, chegando aos questionamentos sobre a pós-modernidade.

Desenvolvendo e articulando questões postas pelas análises da modernidade de Hegel – o fim da arte –, Nietzsche – o eterno retorno – e Walter Benjamin – a história dos restos da história e o reconhecimento de Baudelaire como marco histórico de ruptura, para quem o novo é desesperado pois arrancado do desastre de amanhã –, Compagnon constrói um interessante e pertinente raciocínio filosófico e literário, pautado por reflexões sobre a história e a arte. Sua perspectiva estética, baudelaireana, desenrola-se sobre a compreensão de uma dialética da consciência do moderno e sua falência ou recusa. Assim, compreende a própria arte como testemunho da ilusão do moderno, capaz de esvaziar a noção temporal de progresso e assim abrir a história para um vazio.

 

 

 

 

OS CINCO PARADOXOS DA MODERNIDADE
Autor: Antoine Compagnon
Editora: Editora UFMG
(139 págs.)

 

 

 

 

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