“Este livro é uma discussão a respeito das sombras e de seu papel em nossa experiência visual. Mais especificamente, justapõe as noções modernas sobre as sombras às do século XVIII, com a finalidade de tirar proveito de uma tensão entre elas. Naturalmente, outros períodos históricos também tiveram ideias interessantes a respeito das sombras, mas não é deles que trata esse livro”.
Recuperando as teorias oitocentistas da percepção visual, com o apoio da ciência cognitiva contemporânea, da história da arte e de vasta bibliografia especializada, o professor de história da arte Michael Baxandall, em Sombras e luzes, discute o papel das sombras na representação que se tem das formas, assim como os significados diversos que elas podem assumir.
O autor relaciona as noções modernas sobre as sombras com as desenvolvidas no século XVIII. Partindo de uma descrição detalhada da constituição física e das variedades de sombras, analisa diferentes abordagens científicas e artísticas do fenômeno, incluindo obras de Giotto, Tiepolo, Chardin e da Vinci, entre outros.
Baxandall primeiro faz uma breve introdução a respeito da constituição física das sombras, categorizando dois diferentes tipos físicos. Em seguida, expõe a questão empirista/nativista (discussão acerca da percepção sobre as sombras ser resultado de experiência empírica ou inata ao homem) do século XVIII sobre o papel da sombra na percepção da forma. Trata-se, diz, da linha de base para o pensamento dos três séculos subsequentes. Por isso, Baxandall examina o que lhe parecem os resultados mais interessantes das pesquisas do final do século XX na ciência cognitiva sobre a percepção da sombra. As observações da sombra no século XVIII, constituem o que o pesquisador chama de empirismo rococó – ele analisa e diferencia a observação de artistas da observação de cientistas. A relação recíproca existente entre os universos da ciência, do pensamento e da arte, no que diz respeito à atenção visual à sombra, é examinada à luz da observação do status das sombras na arte pictórica.
O livro conta ainda com um apêndice, que situa e resume a teoria da sombra de Leonardo da Vinci, que exerceu uma forte, apesar de parcialmente oculta, influência no século XVIII – influência que perdura até hoje.
As sombras, diz, são buracos de luz, uma deficiência local e relativa da luz visível: “A sombra tem sua origem numa primeira relação entre o fluxo de luz e uma matéria opaca. A forma de qualquer sombra em especial se deve a uma relação particular entre dois ou três termos principais – uma fonte de luz posicionada, um sólido posicionado e dotado de forma e também, no caso da sombra projetada, um suporte posicionado e dotado de forma ou uma superfície receptora. A forma bruta será modificada por uma série de outros termos menores: a concentração e extensão da fonte de luz, a consistência do meio através do qual a luz passa para o sólido, a posição e a forma das superfícies refletoras adjacentes, a textura e o matiz destas e do sólido (e também, no caso da sombra projetada, da superfície receptora). Uma sombra percebida envolve ainda um outro termo principal, o percebedor posicionado”.
No prefácio, Baxandall contextualiza a atenção filosófica de sua pesquisa:
“O livro foi inspirado por um interesse na observação das sombras, o que será igualmente necessário a seus leitores, mas é matizado pelo fato de ser uma ramificação de um trabalho em andamento sobre os problemas da atenção visual no pensamento do século XVIII, no pensamento moderno e na arte da pintura. A atenção é um conceito tão difuso ou tentacular que atinge a maior parte das áreas da percepção visual, e a sombra é certamente uma dessas áreas: de modo que se pode questionar se as sombras observadas ou não-observadas são a mesma coisa; ou (para dizê-lo de outra forma) se as sombras sobrevivem à atenção”.
A convicção comum a todas as correntes do Iluminismo, diz, “- nativista, empirista, sensacionalista, materialista, associacionista -, a de que a sombra deve de algum modo ser fundamental na nossa percepção do mundo, seja qual for a base de que nos sirvamos para interpretá-la, é tão firme e imperiosa que se torna necessário um grande esforço para desembaraçar-nos dela”.
A edição brasileira foi traduzida por Antonio de Pádua Danesi e publicada pela Edusp em 1997. A editora disponibiliza uma visualização do livro.
Autor: Michael Baxandall
Editora: Edusp
Preço: R$ 52,00 (248 págs.)