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A poética contemporânea de Antonio Cicero

25 setembro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

Político, poético, o trabalho de Antonio Cicero, infinito jogo de espelhos, vem se construindo de maneira ambivalente e coerente. Seu mais recente livro, Porventura, publicado pela editora Record e indicado como finalista ao prêmio Jabuti deste ano, é uma coletânea de poemas escritos desde 2002 e traz muito deste seu caráter intelectual multifacetado.

Antonio Cicero é conhecido também como filósofo, em 1995 publicou o livro de ensaios O Mundo desde o Fim, um questionamento sobre o moderno e a modernidade, que propõe uma concepção de cogito ultracartesiano. Em 2012, a editora Civilização Brasileira publicou seu mais recente livro de ensaios, Poesia e filosofia. Outra de suas facetas, porém, é a parceria com músicos populares brasileiros como João Bosco, Marina Lima (sua irmã) e Lulu Santos. Também foi longa sua parceria com o poeta e letrista Waly Salomão. Pode-se dizer de maneira geral que no trabalho deste poeta filosófico o limite entre o popular e o erudito é constantemente transposto.

Exatamente esse limite é uma das questões de sua poesia. Em entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, em agosto, disse: “De fato, escrevo em primeiro lugar para um leitor ideal, que aprecie poesia e conheça as referências literárias que faço. […] Por outro lado, gosto de pensar que meus poemas podem ser apreciados nos mais diferentes níveis, por pessoas de diferentes formações culturais, pois admiro imensamente poetas que conseguem fazer isso”. Como diria Ezra Pound, em O ABC da literatura, “o poema deveria entusiasmar o leigo e deliciar o especialista”.

O resultado é que sua poesia é humorada, mas suas brincadeiras são eruditas. Seu tempo é contingente mas também mitológico, e por isso equilibra-se sutilmente sobre o negativo e o relativo. A dúvida sobre o moderno, exposta no primeiro livro filosófico, desdobra-se na dêixis do instante, passageiro, nas poesias.

Em Porventura há um distanciamento suavemente melancólico, escondido nas madrugadas, nas evocações dos clássicos, na morte de entes próximos. As flores são artificiais, o olhar esverdeado é puro absinto, as palavras voam sem sobrarem senão como lembranças. Um dia, apaixonado, encarei a minha / morte: e eis que ela não sustentou o olhar / e se esvaiu. Desde então é a morte alheia / que me abate.

“Que não se engane ninguém: ser um poeta é uma África”

 

PORVENTURA
Autor: Antonio Cicero
Editora: Record
(80 págs.)

 

Leia algumas das poesias na edição 67 da revista piauí.

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