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“[…] Fizemos renascer o projeto de 1870, quando o otimismo brasileiro parecia exigir o impossível. E procuramos desempenhar a nossa tarefa com o afinco de uma guerra contra o crime que lesava as possibilidades do lucro cada vez maior. Derrubamos árvores seculares, enfrentamos e civilizamos selvagens que mourejavam na idade da pedra, aqui estamos trabalhando com a disposição de dar até a nossa própria vida porque é assim o gênio americano“.
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O escritor amazonense Márcio Souza é autor de mais de 20 livros. Mad Maria, um dos mais notórios dentre eles, escrito em 1980, é de atualidade metafórica desconcertante.
No final da primeira década do século XX, o governo brasileiro decide construir uma ferrovia na selva amazônica, obra mirabolante com o intuito de criar um caminho que contornasse as dezenove corredeiras mortais do rio Madeira, região de relevante passagem para os produtos importados e exportados pelos bolivianos – a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM), que integraria uma região rica em látex na Bolívia com a Amazônia. Antes de terminadas as obras, 3,6 mil homens estavam mortos, 30 mil hospitalizados e uma fortuna em dólares desperdiçada na selva.
“[…] a ferrovia estava sendo construída num silêncio de certo modo planejado, ele já tinha sofrido muitos ataques através da imprensa devido à falta de lisura na concorrência pública, um deslize grosseiro de seu testa de ferro, o engenheiro Joaquim Catambri, homem um tanto autoritário e corrompido que realizara as transações sem esconder os detalhes escusos”. Na realidade, a região era tão inóspita que a construção ligaria nada a parte alguma. O romance narra um dos tantos absurdos lucrativos patrocinados pela história brasileira, contrapondo a construção da estrada em plena selva às negociatas envolvendo a relação político-econômica entre o construtor e concessionário, Percival Farquhar, com o novo governo do presidente Hermes da Fonseca e seu ministro da Viação e Obras Públicas, J. J. Seabra. Continue lendo