Luta por reconhecimento – A gramática moral dos conflitos sociais, de Axel Honneth, desenvolve uma teoria social normativa baseada na ideia de que o florescimento humano e a plena realização pessoal dependem da existência de relações éticas bem estabelecidas. Honneth, filósofo e sociólogo alemão, é diretor do célebre Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt e, herdeiro da Teoria Crítica fundada por Horkheimer e Adorno, seguiu a proposta de Habermas ao sugerir uma teoria como solução aos impasses de seus antecessores; é considerado, atualmente, o representante da terceira geração da “Escola de Frankfurt”.
A abordagem de Honneth parte do modelo conceitual do jovem Hegel de “luta por reconhecimento” para embasar a reflexão sobre a formação da identidade como um processo intersubjetivo entre parceiros de interação, propondo um modelo teórico de análise da identidade. O conceito, utilizado como chave metodológica para a compreensão dos conflitos sociais, foi elaborado por Hegel de maneira inversa ao modelo hobbesiano, definindo a esfera social não como o espaço de luta pela integridade física dos sujeitos, mas como espaço da eticidade [Sittlichkeit]. A luta social não é uma luta por poder, mas uma luta por reconhecimento, conflito que expressa a lógica do desenvolvimento moral da sociedade. Como aponta Herbert Ravagnani, em artigo publicado na revista Kínesis, da “perspectiva da teoria do reconhecimento, os atores da vida social não podem ser compreendidos separadamente do contexto moral e cultural em que estão inseridos. Esse contexto quase sempre se encontra escondido, subentendido nas práticas sociais e políticas de um povo […] É a partir da intuição hegeliana de uma luta motivada moralmente que Honneth irá encontrar também os [seus] pressupostos”. Para Ravagnani, Honneth mostra “como a percepção da identidade pessoal está vinculada intrinsecamente com o reconhecimento recíproco, e o papel extremamente necessário do conflito ou luta para o desenvolvimento gradual das relações de reconhecimento”.
A análise de Honneth é fundada, por um lado na concepção hegeliana e, por outro, na teoria da socialização desenvolvida por George Herbert Mead, combinando ambas concepções na formulação de sua teorização. De acordo com Suzana Guerra Albornoz, em artigo publicado nos Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, “as três esferas do reconhecimento afirmadas por Hegel […] encontram continuidade e complemento nas três dimensões do reconhecimento que aparecem na psicologia social de George Herbert Mead (1863-1931), cujo sistema teórico foi chamado de “interacionismo simbólico”. A psicologia social desse autor, no que se refere à teoria do reconhecimento intersubjetivo, segundo Honneth, constitui uma ponte entre a ideia original de Hegel e o modo de pensar do nosso tempo, e os escritos de Mead poderiam ser vistos como uma tradução da teoria hegeliana da intersubjetividade numa linguagem teórica pósmetafísica”. Segundo análise de Albornoz, através dos “meios construtivos da psicologia social de Mead teria sido dada uma inflexão materialista à teoria hegeliana da luta por reconhecimento. Enquanto Hegel desenvolveu a teoria do reconhecimento até chegar a um modelo de conflito de maneira idealista, Mead continuou aquele trabalho, de uma forma que se pode chamar de materialista. E assim, ambos os pensadores referidos, em contraposição à tradição teórica da filosofia política, de Maquiavel e Hobbes até Nietzsche, deram à luta social uma interpretação, digamos, positiva, como força que estrutura a evolução moral da sociedade. A teoria de Mead, como a de Hegel, desembocaria na distinção de três formas de reconhecimento recíproco: primeiro, a esfera da dedicação emotiva; segundo, a das relações amorosas e das amizades; da qual, em terceiro, se distinguem a esfera do reconhecimento jurídico e a do “assentimento solidário”.
A teoria do reconhecimento elaborada por Honneth é a um tempo teórico explicativa e crítico normativa, na medida em que procura servir de modelo explicativo do processo de evolução social e avaliativo dos conflitos sociais contemporâneos através da abordagem moral do próprio conceito de luta social. Grosso modo, para ele, a determinação da identidade dos indivíduos seria dada por um processo intersubjetivo mediado pelo mecanismo do reconhecimento e, portanto, a ausência de reconhecimento intersubjetivo e social seria o mote dos conflitos sociais. Honneth fornece valiosos elementos para a fundamentação da luta por direitos humanos, dando-lhes fundamentação filosófica. Uma das grandes contribuições da retomada de uma teoria da luta por reconhecimento é sua indicação como chave de compreensão para os conflitos sociais enquanto reivindicações éticas, que tanto contribuem para a ampliação das possibilidades de subjetivação, como aperfeiçoam o panorama ético como um todo.
Autor: Axel Honneth
Editora: 34
Preço: R$ 32,20 (296 págs.)