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“tudo é história”

20 junho, 2017 | Por Isabela Gaglianone

Retrato de George Sand, ou Amantine Aurore Lucile Dupin, por Delacroix

O preconceito de gênero reside por entre as linhas de um texto. Cada vez menos, felizmente, ao que parece? Será, um texto escrito por uma mulher, lido de maneira diversa do que se o tivesse sido escrito por um homem? Certamente, no século XIX, assim ainda o era. E não por acaso, uma mulher que utilizou um pseudônimo masculino, justamente para fazer livremente referência os direitos da mulher, especialmente no tocante ao prazer e à igualdade de direitos com relação aos homens, tornou-se um marco na história do romantismo francês:

George Sand foi o pseudônimo escolhido por Amantine Aurore Lucile Dupin, nascida em 1804, em Paris, no seio de uma família aristocrática, e falecida em Nohant, em 1876. Deixou romances e trabalhos memorialísticos que a tornaram um dos maiores expoentes das letras do século XIX, tendo sido a primeira mulher francesa a viver de seus direitos autorais. Ao adotar seu pseudônimo, George Sand havia decidido se tornar uma escritora profissional.

História da minha vida, que acaba de ser lançado pela Editora Unesp, com tradução de Marcio Honorio De Godoy e organização de Magali Oliveira Fernandes, é uma das obras mais importantes da autora.

Trata-se da autobiografia de George Sand, escrita de de 15 de abril de 1847 a 14 de junho de 1855, com alguns intervalos na redação dos originais. Surpreendente obra, não por um talvez esperado tom confessional ou íntimo – a escritora George Sand é conhecida por ter vivido intensos relacionamentos amorosos, vários com outros escritores ou artistas, dentre os quais Mérimée e Frédéric Chopin -, mas pelo delineamento, ao mesmo tempo sutil e profundo, traçado por entre o mundo real e o ficcional, através de suas lembranças pessoais, impulsionado pela ideia motriz de que “tudo é história”.

Com sua auto-biografia, defende assim uma espécie de teoria da simplicidade, deixando-se levar pelos mecanismos da memória.

A edição original da obra foi publicada em 1856, por intermédio de Michel Lévy Frères, da parisiense Libraires-Editeurs, em dez volumes.

Como contam as pesquisadoras Patrícia Rodrigues Costa e Germana Henriques Pereira de Sousa, no artigo “George Sand no Brasil”: “Em 1831, a jovem Amantine viaja a Paris e mantém um círculo de amizades que incluía artistas, intelectuais e políticos. Em meio a esse círculo, Amantine conhece Jules Sandeau, também um escritor iniciante. Para compor seu pseudônimo, usou parte do nome do amante, a fim de possibilitar a publicação e maior circulação de seus textos, além de proteger a si mesma e a suas obras contra o preconceito em relação a uma escrita feminina. A partir de 1832, com a publicação de Indiana, seu primeiro romance de autoria individual, um sucesso de público, Amantine passa a utilizar o pseudônimo George Sand. Além de utilizar um pseudônimo masculino, George Sand vestia-se com trajes masculinos para poder participar de atividades, à época, consideradas apanágio dos homens, como, por exemplo, as reuniões literárias”.

George Sand foi sem dúvida uma mulher à frente de seu tempo. Nas palavras do jornalista Max Altman, em artigo: “Apaixonada e exuberante, revolucionária e republicana até a alma, ela trava, à margem de seus trabalhos literários, muitos combates políticos além de engajamentos feministas mais de século antes que se tornasse luta comum. Em 1830, faz campanha em Nohant em favor de um candidato republicano. Interessa-se pelo catolicismo social de Lamennais sob influência de seu amigo Franz Liszt. Em 1848, funda uma revista com o eloquente título de A Causa do Povo, destinado a um longo futuro. Ela não temia em absoluto escandalizar as boas almas ostentando modos masculinos ou fumando em público. Isto não a impediu de gozar da amizade de Balzac, Flaubert, Victor Hugo e ainda do pintor Delacroix”.

Segundo Garcia, Morais e Lee, em artigo, “George Sand é a primeira mulher a usar o gênero autobiográfico, a primeira mulher que se comprometeu em falar e publicar sua vida. […] nenhuma ainda havia ousado a descrever a sua história na cena pública, como a história de sua vida, a construção e defesa da sua identidade”.

 

 

 

 

HISTÓRIA DA MINHA VIDA

Autor: George Sand
Editora: Unesp
Preço: R$ 130,00 (650 págs.)

 

 

 

 

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