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A ação política ameríndia e seus personagens

28 outubro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

Capa do livro de antropologia "O Profeta e o Principal", publicado pela EduspO excelente livro de Renato Sztutman, professor de antropologia da Universidade de São Paulo, O profeta e o principal: a ação política ameríndia e seus personagens, publicado pela Edusp, foi um dos três selecionados a finalista do prêmio Jabuti na categoria de obras não ficcionais da área de ciências humanas. No livro, Sztutman parte das ideias de Pierre e Hélène Clastres a respeito dos mecanismos indígenas de recusa e conjuração do poder coercitivo e de toda unificação ontológica. Baseado nos estudos etnológicos de ambos, o antropólogo brasileiro estuda a imbricação entre o que convencionamos chamar de “religioso” e “político”, analisando o reconhecimento ambíguo, entre os antigo Tupi, de seus pajés e chefes de guerra como “profetas” e “principais”.

Para Sztutman, ainda que a reflexão de Hélène Clastres deva muito ao projeto de antropologia política de Pierre, é possível traçar tanto convergências como distanciamentos teóricos entre os dois autores, propondo, assim, novas diretrizes para o debate que iniciaram. Segundo ele, o livro de Hélène, A terra sem mal: o profetismo tupi, de 1975, desenvolve e estende, por meio de um caso particular, a tese sustentada nas duas coletâneas de ensaios de Pierre Clastres, A sociedade contra o Estado, de 1974, e Arqueologia da violência, de 1980, ambas dedicadas a pesquisas de antropologia política.

Nas palavras de Renato Sztutman, “Hélène Clastres, atendo-se ao estudo de populações tupi-guarani, no passado e no presente, identificou esses mecanismos num fenômeno por assim dizer religioso designado “profetismo”; fenômeno sustentado por uma série de concepções relativas à condição humana e à socialidade e por um impulso de evasão, de busca por territórios desconhecidos muitas vezes designados como “terra sem mal”, lugar onde a ordem social como que se inverte. Ao debruçar-se sobre esse tema, Hélène atinou para um ponto delicado na obra de Pierre Clastres, qual seja, a relação entre o que costumamos chamar de o “político” e o “religioso” e, mais especificamente, a maneira como esta se estabelece entre certas populações de língua tupi-guarani que, ao longo dos séculos XV e XVI, parecem ter se deparado com a ameaça de irrupção de uma espécie de poder político separado, e, atualmente, parecem elaborar uma séria reflexão sobre a possibilidade de seu próprio desaparecimento. A terra sem mal constitui uma análise aprofundada de como uma religião pode se converter num mecanismo de resistência ao mesmo tempo ontológica e política, combater um ideal de transcendência aderindo a um projeto de imanência” [in: Religião nômade ou germe do estado? Pierre e Hélène Clastres e a vertigem tupi].

É no entroncamento entre as pesquisas desenvolvidas por ambos que o livro de Sztutman analisa, de maneira clara e instigante, nos movimentos proféticos, a formação de um germe de poder político: a partir do momento em que a palavra profética, libertária, perde a sua inocência e faz-se voz de comando. O profetismo, enquanto movimento de busca da terra sem mal, torna-se núcleo de uma filosofia social e política. A análise desenvolve-se sobre os paradoxos encontrados nas convergências e divergências entre o político e o religioso, em suas ambiguidades e coexistência problemática – a ação política desenvolvida entre “o profeta e o principal”.

O PROFETA E O PRINCIPAL: a ação política ameríndia e seus personagens
Autor: Renato Sztutman
Editora: Edusp
Preço: R$ 59,50 (576 págs.)

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