Literatura

Fictício; imaginário

23 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

O que é o ficcional? Qual o jogo de oscilação entre imitação e simbolização numa obra literária? Qual a interação entre o fictício e o imaginário? Wolfgang Iser desenvolve a complexa questão da ficcionalidade e suas implicações antropológicas, localizando-a na imbricação entre a teoria literária – através da análise das literaturas clássica e renascentista inglesas, principalmente – e a teoria do conhecimento – pelo diálogo com a filosofia moderna e pela identificação da tematização da ficção no discurso filosófico, num panorama histórico que vai de Bacon a Vaihinger, passando por Sartre e Castoriadis. Sua investigação tem, como aplicação, um dos pontos culminantes na análise da literatura fantástica, “que converte a fantasia em realidade e a realidade em um território conquistado da fantasia”, representando portanto um nó da questão da mobilização do imaginário, no ato de leitura, uma vez que a fantasia reorganiza e inverte o real. Segundo Iser, “se há uma ‘lógica do imaginativo’, ela existe sobretudo como a suspensão de uma consciência focalizante, cujos vestígios só podem ser encontrados nas formas bizarras da fantasia que a inundam”. Sua interessante argumentação, nesse sentido, baseia-se na análise do monólogo de Beckett, Imagination Dead Imagine: “[…] no ato imaginativo inscreve-se sua autossuspensão, pois ele deve se apresentar como o ser extinto daquilo que é. O componente da consciência, portanto, não indica mais do que a mera direção e reduz-se em seus efeitos, pois se trata de imaginar a autossuspensão de um ato imaginativo”.

Segundo o crítico Luiz Costa Lima, o ficcional “põe em perspectiva verdades socialmente aceitas, através de um envolvimento que, sendo intelectual, não pode descurar de ser também afetivo”. Para ele, “mediante essa teorização, Iser pensa o ficcional literário como algo inconfundível, digno por si e não pela “ilustração” que contivesse em quadros históricos ou posições filosóficas”. Iser, assim, “desdobra a pergunta sobre o que é o ficcional, tanto em plano literário como do ponto de vista da teoria do conhecimento”.

Dau Bastos, no prefácio, analisa que “a ousadia e a singularidade” do pensamento de Iser “indicam uma abertura de espírito perceptível igualmente na maneira libertária com que aborda o objeto ficcional, assim como em sua capacidade de interlocução”. Segundo Bastos, a abordagem de Iser “parte do pressuposto de que o ato de ficcionalizar é inerente ao ser humano, que, tenha consciência dele ou não, depende dele para praticamente tudo, da realização das tarefas corriqueiras à busca de conhecimento sobre si mesmo e acerca do mundo”.

O epílogo do livro, dividido em dois capítulos, “Mimesis e performance” e “A encenação como categoria antropológica”, articula a história da afirmação da ficcionalidade literária a mudanças no registro do conceito de mimesis. Sem buscar inventariar essas mudanças, o autor trabalha com entrelaçamentos sobre as reflexões desenvolvidas, a respeito do assunto, por três pensadores do século xx: E. Gombrich, Paul Ricoeur e Theodor Adorno.

 

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“É preciso desenvolver uma heurística para a antropologia literária: ela envolve, de um lado, disposições antropológicas, e, de outro, busca analisar as diversas manifestações históricas e tematizações sistemáticas do fictício e do imaginário; como ambos se furtam a uma determinação transcendental, só podem ser captados contextualmente”.

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O FICTÍCIO E O IMAGINÁRIO

Autor: Wofgang Iser

Editora: EdUERJ
Preço: R$ 30,00 (366 págs.)

 

 

 

 

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