Lançado em julho, o livro O louco de palestra, de Vanessa Barbara, reúne crônicas publicadas originalmente em jornais como Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo e revistas como piauí. Os textos versam com graça sobre figuras típicas de bairros paulistanos, sobre linhas de ônibus na aglomerada cidade, comentários televisivos, observações sobre o urbanismo desmazelado das cidades brasileiras. A autora cristaliza tipos que sempre existiram, identificando-os e definindo-os. Bem-humoradas e sagazes, as observações sobre os tipos brasileiros misturam-se às dos específicos tipos paulistanos, através da peculiaridade da escrita da jovem autora, cujo tom e exemplos torna sua prosa acessível e interessante a qualquer pessoa. Aliando delicadeza, humor e certo escárnio, os textos de Vanessa Barbara ocupam um lugar movediço, ao mesmo tempo intermediário entre a reportagem, a crônica, o ensaio e a antropologia.
Como apontou em breve resenha Marco Severo, se “na primeira parte do livro temos a impressão de que a coletânea é “paulista demais”, na segunda e terceira parte, Vanessa Barbara nos faz compreender que o aparente microcosmo na verdade é macro – e é mesmo universal. Suas crônicas – urbanas desde o título – são fruto dos temas que lhe são caros: o transporte (mais notadamente, o ônibus), o sentimento em relação à polícia, aos políticos, às agregações a que chamamos de sociedade e as dificuldades de se posicionar e se colocar diante do mundo, a complexidade de morar juntos, os diversos tipos de indivíduos e suas singularidades, as agruras sofridas durante viagens internacionais – está tudo lá, de forma plena e repleta de força, verdade e, por que não, um humor fino, sem o qual não se consegue levar o suplício da vida adiante”.
A engraçada crônica que dá nome ao livro pode ser lida no site da revista Piauí. Outro ótimo texto que consta no volume, a crônica “O Mandaquiense”, também pode ser conferida no mesmo site.
Vanessa Barbara nasceu em São Paulo, em 1982. É jornalista, tradutora, cronista e colunista: escreve para grandes jornais e revistas brasileiros e é colaboradora do International New York Times. Publicou O livro amarelo do terminal (Cosac Naify, 2008, prêmio Jabuti de reportagem), O verão do Chibo (Alfaguara, 2008, com Emilio Fraia), o infantil Endrigo, o escavador de umbigo (Editora 34, 2010, com Andrés Sandoval), o romance Noites de alface (Alfaguara, 2013) e a graphic novel A máquina de Goldberg (publicada pela Companhia das Letras, 2012, com Fido Nesti). Foi selecionada pela revista Granta para a edição “Os melhores jovens escritores brasileiros”.
A Companhia das Letras disponibiliza trecho para visualização.
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Trecho de “O louco de palestra”
Em dezembro passado, o escritor gaúcho André Czarnobai, o Cardoso, publicou um diário na piauí intitulado “Pasfundo calipígia”. Salvo engano, foi a primeira vez em que se utilizou em letra impressa o termo “louco de palestra”. Imediatamente, a expressão ganhou densidade acadêmica e popularizou-se nos redutos universitários nacionais, encorajando loucos latentes e chamando a atenção da saúde pública para o problema.
O louco de palestra é o sujeito que, durante uma conferência, levanta a mão para perguntar algo absolutamente aleatório. Ou para fazer uma observação longa e sem sentido sobre qualquer coisa que lhe venha à mente. É a alegria dos assistentes enfastiados e o pesadelo dos oradores, que passam o evento inteiro aguardando sua inevitável manifestação, como se dispostos a enfrentar a própria Morte.
Há inúmeras categorias de loucos de palestra, que olhos e ouvidos atentos podem identificar em qualquer manifestação de cunho argumentativo-reflexivo, com a palavra franqueada ao público.
Há o louco clássico: aquele que levanta, faz uma longa explanação sobre qualquer tema, que raramente tangencia o assunto em debate, e termina sem perguntar nada de específico. Seu único objetivo é impressionar intelectualmente a plebe, inclusive o palestrante oficial. Ele sempre pede licença para “fazer uma colocação”.
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O LOUCO DE PALESTRA – E OUTRAS CRÔNICAS URBANAS
Autor: Vanessa Barbara
Editora: Companhia das Letras
Preço: R$ 37,00 (200 págs.)