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Rã-txa hu-ni-ku-ĩ…

16 novembro, 2017 | Por Isabela Gaglianone

“Consegui finalmente apanhar o tipo sintático da língua, um verdadeiro ovo de Colombo, e agora aparece-me em toda a sua unidade através de todas as particularidades. Aos vaivéns da rede, parece-me tudo simples e harmônico” – Capistrano de Abreu, carta a Pandiá Calogéras, de 28 de setembro de 1910.

Cena do filme "A história dos Caxinauás por eles mesmos"

Fotografia do livro “A história dos Caxinauás por eles mesmos” [“Huni kuin hiwepaunibuki”] , organizado por Eliane Camargo e Diego Villar [Edições Sesc, 2014]

Rã-txa hu-ni-ku-ĩ… A língua dos Caxinauás do Rio Ibuaçu, afluente do Muru, estudo de fôlego do historiador, etnógrafo e lingüista cearense João Capistrano de Abreu (1853-1927), foi publicado originalmente em 1914 e, no ano passado, ganhou uma reedição pelas editoras da Unicamp e Unemat, organizada pela linguista Eliane Camargo, pesquisadora associada do Centro de Ensino e Pesquisa em Etnologia Ameríndia, Erea, do Centro Nacional da Pesquisa Nacional da França. A obra contém quase 6 mil frases em Rã-txa hu-ni ku-ĩ [da família linguística Pano], numeradas e acompanhadas de tradução literal em português. Apresentam narrativas mitológicas e experiências cotidianas, de modo que perpassam diversos aspectos da cultura Caxinauá [ou Huni Kuĩ], como a preparação de alimentos, interpretação de sonhos, instruções sobre ofícios e condutas na resolução de conflitos e delitos, aspectos da vida sexual e ritos de festa, caça, enterro e luto. A obra versa sobre “a língua dos homens verdadeiros”, que é a tradução do título e a denominação dada pelos falantes nativos à língua.

Na presente edição, o trabalho de Capistrano de Abreu encontra-se revisado e corrigido, de acordo com os parâmetros da linguística e da escrita caxinauá contemporâneas. O volume conta com preciosos comentários e textos de apresentação.

De acordo com Leonardo Barbosa, editor da Unicamp, em resenha publicada pelo Jornal da Unicamp, João Capistrano de Abreu “dedicou-se ao estudo do período colonial da história brasileira, elaborando conceitos de raça, terra e clima, típicos da visão europeia sobre as regiões tropicais, assim como a pesquisas sobre dois grupos indígenas, os Baicaris e os Caxinauás, priorizando descrições de suas tradições, costumes e mitos. Constituiu, assim, um campo de conhecimento fundamental para pesquisas posteriores sobre estes e outros povos indígenas do Brasil. Nesse cenário, o estudo e a tradução das narrativas ameríndias Caxinauás, empreendidos por Capistrano de Abreu, são um dos marcos decisivos no início do trabalho etnolinguístico brasileiro”. O editor conta que, para o trabalho de revisão do texto original, Eliane Camargo entrou em contato com falantes do Rã-txa hu-ni ku-ĩ, “que leram, ouviram e recontaram as histórias e os fatos registrados no trabalho centenário, muitas vezes fazendo contato pela primeira vez com aspectos de sua cultura que haviam se perdido no tempo”.

O trabalho de Capistrano de Abreu foi realizado com a colaboração de dois informantes nativos que moraram em sua companhia. Além da coletânea dos textos e de suas traduções, a obra contém um “vocabulário brasileiro-caxinauá” com 1781 verbetes e um “vocabulário caxinauá-brasileiro”, com 4329, além de ensaio linguístico sobre a família linguística Pano. A transcrição das narrativas tradicionais, traduzidas palavra por palavra, tornam a construção da frase portuguesa “um espelho da sintaxe na língua original”, como pontuou Beatriz Protti Christino, professora da UFRJ, em seminário apresentado no GEL [Grupos de Estudos Linguísticos do Estado de São Paulo] em 2008.

No artigo “Os vaivéns da rede (internacional) de Capistrano de Abreu”, Christino comenta a relevância da decisão historiográfica de Capistrano de Abreu quanto ao seu objeto de estudo: “Como afastava-se da corrente, então dominante, que percebia na história do Brasil uma coleção de feitos protagonizados pelos administradores portugueses e julgava que um estudo histórico do nosso país devia dar atenção a todos os elementos formadores da população, Capistrano de Abreu tomava a etnologia ameríndia como uma das faces do trabalho do historiador. Por longos períodos de sua vida, que abrangem os anos de 1892 e 1895 e, conforme atestam os três volumes de sua correspondência publicada, também entre 1915 e 1927, ele examinou o bacairi, língua da família caribe, então falada nas ‘cabeceiras do Tapajós e do Xingu em Mato Grosso’. Parte de suas reflexões provenientes do trabalho com o bacairi veio à luz em 1895 em artigos publicados na Revista Brazileira, dirigida por José Veríssimo (1857-1916). O caxinauá, língua da família pano, em uso nas margens do rio Ibuaçu na região do rio Tarauacá, afluente da margem direita do rio Juruá (atual estado do Acre), ocupou-lhe, pelo menos, nos anos de 1908 a 1914. Desse esforço, resultou o rã-txa hu-ni-ku-ĩ, composto com o auxílio de dois informantes nativos e publicado em 1914”. A historiadora pontua que, no entanto, “se, de um lado, a investigação de línguas indígenas, naquele momento em nosso país, até poderia ser considerada ‘um estudo exótico, estéril’ por não integrar as preferências dos letrados, no plano internacional, encontrava-se em plena atividade uma comunidade bem articulada de especialistas nas línguas e culturas da América do Sul. Quando se leva em conta o circuito de produção e circulação do saber dessa comunidade de especialistas, fica claro que o sul-americanista Capistrano de Abreu não foi um pesquisador isolado”. Christino aponta que, “quanto mais a realidade dos sertões e das florestas sul-americanas se tornava conhecida pelos cientistas, mais se enfraquecia a esperança de encontrar regiões completamente intocadas pelo homem branco. Por isso, ganhavam relevância as informações sobre povos que ainda se mantinham completamente afastados dos modelos europeus de civilização e conservavam como que imaculadas sua língua e suas manifestações culturais. Os sul-americanistas lamentavam que fossem comuns as notícias de grupos indígenas já extintos, em processo de desaparecimento ou severamente atingidos por epidemias. Diante do avanço sempre crescente e devastador da ‘civilização’, aqueles especialistas ressaltavam a necessidade urgente de promover pesquisas lingüísticas e etnográficas sérias. Tratava-se de uma corrida contra o tempo para registrar o que ainda restava das línguas e culturas indígenas, evidenciada pelo freqüente recurso a expressões como ‘última hora’ e ‘última oportunidade’”. Advertências quanto ao extermínio de línguas e culturas feitas a esmo, há mais de um século; esmo cujas ressonâncias espalham-se atualmente em alto e bom som através dos vastos campos que há pouco eram parte do famoso pulmão do mundo, além de reduto de complexidades culturais das mais diversas. Segundo Christino, em carta, Capistrano de Abreu “explicitou que a preocupação em registrar a língua dos caxinauás, permitindo que a posteridade tivesse memória de sua existência, levou-o a compor o rã-txa hu-ni-ku-ĩ. De acordo com suas palavras, ‘[o]rganizei-o para não suceder com esta o mesmo que com uma língua do Orinoco, conservada apenas por um papagaio, afirma Humboldt’”. A historiadora prossegue: “Não escaparam à percepção dos sul-americanistas as razões que engendravam o declínio constante do contingente de população indígena e a perda sempre mais acentuada de seus traços culturais. Sem partilhar das teorias de desigualdade racial, em voga em outros círculos de intelectuais no período 1890-1929, os sul-americanistas recusavam-se a aceitar que as civilizações não-brancas teriam, sempre que se desse o contato, de sucumbir diante da pretensa superioridade intelectual e cultural dos brancos. Seus textos mostram que o domínio dos brancos fundamentava-se no uso da violência e não nascia de um desejo de divulgar formas mais avançadas de vida em sociedade, mas da intenção de explorar economicamente as terras indígenas. Koch-Grünberg, por exemplo, declarou de maneira contundente: ‘Die Hauptgründe für das Aussterben der Naturvölker kann man, meiner Absicht nach in dem einen Wort zusammenfassen: Kapitalismus’. [As principais razões da extinção dos ‘povos da natureza’ podem, na minha concepção, ser resumidas em uma palavra: Capitalismo]”.

À época, os principais responsabilizados eram os seringalistas. Segundo Christino, “Nordenskiöld denunciou que ‘a febre da borracha’ tinha, de forma direta ou indireta, devastado a maior parte do oeste da Bolívia e tornou público que o processo de obtenção da borracha contava com mão de obra indígena escravizada. […] Capistrano de Abreu aludiu à grave ameaça que os exploradores da borracha representavam para os povos pano na seguinte passagem de seu rã-txa hu-ni-ku-ĩ: ‘Nas linguas estudadas pelos missionarios [Conivo, Sipibo e Pano], o accento cáe na penultima. Continuarão no mesmo rumo? […] Os seringueiros terão cuidado de sepultar a resposta no limbo dos ‘ignorabimus’”.

Segundo Joaquim Paulo de Lima Kaxinawá, conforme pontua em sua Dissertação de mestrado apresentada e defendida na UNB e intitulada “Confrontando registros e memórias sobre a língua e a cultura Huni Kuĩ: de Capistrano de Abreu aos dias atuais”, o povo falante do rã-txa hu-ni-ku-ĩ, os Huni kuĩ, localizam-se geograficamente na região norte do Brasil, no estado do Acre e no sudeste do Peru: “Antes do contato com os não índios, o número de pessoas Huni kuĩ era muito maior. Com os violentos massacres comandados por grileiros e senhores da exploração da borracha peruanos e brasileiros (1982, 1994), foram diminuindo e se dividindo, subindo os rios principais do estado do Acre em busca de locais em que pudessem escapar dos inimigos. Nessa fuga os Huni kuĩ foram perdendo muitos dos seus conhecimentos tradicionais, sementes e outros bens, materiais e imateriais, que constituíam o seu mundo social e cultural. […] Grande parte das práticas culturais e ciências foram sendo deixadas de lado, por um lado porque, com a divisão das famílias em fuga, o conhecimento coletivo se fracionava, e por outro lado, pela morte de muitos velhos sábios que eram os guardiões ou repositórios do conhecimento tradicional Huni kuĩ”. Quanto à sua língua, diz Joaquim Kaxinawá, “foi sendo pressionada pela língua do colonizador, e quando as famílias se comunicavam em hãtxa kuĩ, os nawa (portugueses ou brancos) faziam descaso, depreciavam e falavam para eles falarem direito, certo, como gente, e que não ‘cortassem gira’. Com essas repressões, os Huni kuĩ foram ficando com medo de falar na frente dos nawa e foram deixando também de transmitir a língua materna para seus filhos e netos”. O maior desafio do povo Huni kuĩ é, para o pesquisador, manter seus conhecimentos tradicionais – suas festas, suas regras de parentesco, sua língua, sua ocupação de espaço, a transmissão de ensinamentos dos mais velhos aos mais novos -, “mesmo adquirindo novos conhecimentos e tecnologias do mundo que nos cerca”. É interessante que o trabalho do pesquisador indígena em estruturar gramaticalmente a língua de seus antepassados tenha sido estimulado pela leitura do texto de Capistrano de Abreu, conforme ele conta: “A análise dos textos coletados por Capistrano resultou em um material de trabalho multifuncional na formação do autor desta dissertação. O material escrito suscitou a leitura do mesmo e serviu de estímulo para a pesquisa de outras versões das mesmas histórias em diferentes terras indígenas. Esta pesquisa contribuiu para o estudo fonético e fonêmico dos dados do Hãtxa kuĩ, assim como para a fonemização dos dados registrados por Capistrano. O mesmo material serviu de fonte de informação para o estudo de variantes dialetais da língua Hãxta kuĩ no Brasil. A coleta de outras versões das histórias registradas por Capistrano permitiram que conseguíssemos não só analisar os textos, mas ampliar as informações não disponíveis em razão, muito provavelmente da forma de registro das histórias por Capistrano, que, na época, não contava com gravadores, e não era ele proficiente na língua. O material de Capistrano foi também de importância para que estabelecêssemos um diálogo entre a fonologia da língua e sua escrita, consideradas as mudanças em processo”.

Como diz o antropólogo Philippe Erikson, no prefácio à esta cuidadosa co-edição publicada pelas editoras das Universidades de Campinas e do Mato Grosso, o livro disponibiliza um rico conteúdo “não apenas para o mundo da pesquisa, mas também para os caxinauás contemporâneos que irão (re)encontrar uma parte importante de seu patrimônio cultural”. Segundo o antropólogo, “reconhecido desde sua publicação como obra-prima, […] o texto foi rapidamente traduzido, ou melhor, adaptado, em diferentes línguas […]. Claude Lévi-Strauss, em sua obra Mitológicas (1964-1971), cita várias vezes Capistrano de Abreu, e emite um número considerável de comentários sobre esse marco nos estudos americanistas”.

 

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.Trecho.

 

Sonhos, Namakidan

 

  1. Na nun uxai dakaadan, na nun namamisdan.

Nós deitamos para dormir e sonhamos.

  1. Na nun namaidan, mawa txai nun nimis kiaki, na nun namaidan.

Nós sonhamos e (nos sonhos) para muito longe passeamos.

  1. Na nun nama imisdan, uxa dakaa, na nun namamisdan.

Nós dormimos deitados e sonhamos.

  1. Uxa dakaa, namaidan, nukun yuxidan mawa nanta nimiski, aki nukun yuxidan.

Nós dormimos deitados, sonhamos e nossa alma para muito longe passeia.

  1. Nukun yuxidan, nun uxa dakaa, nukun yuxin nukun yuda, nukun paxkabaini.

Nós dormimos deitados; nossa alma saiu de nosso corpo e nos largou.

  1. Nukun yuxin, nun uxa dakaken, nukun yuxindan bai, nimiski, aki.

Nós dormimos deitados; nossa alma passeia, caminha por aí.

  1. Nukun yuxin baidan, nukun nabu mawayama, nun hatu yuxinki ba imiski, aki.

Nossa alma passeia com as almas de nossos parentes que já morreram.

  1. Nukun yuxin baidan, nukun nabu mawayama yuxin hiwea medan nun hatuki hikia, mawa dua wamisbuki.

Nossa alma passeia e entra na casa das almas de nossos parentes mortos; somos bem-recebidos.

  1. Nukun yuxin, nun hatuki badan, nukun nabu yuxin hiwe medan nun hikia, mawa nukun piti inanmisbuki, aki, nukun nabudan.

           Nossa alma passeia na casa de nossos parentes que já morreram; oferecem-nos bastante comida.

  1. Nukun nabu yuxinindan, nukun yuxin nun hatuki badan, na atsahua nukun inakin, tama tsui nukun inankin, mani huxim nukun inankin, mawa piti huaxun, nukun inanbu.

Passeamos com as almas de nossos parentes e nos dão de comer macaxeira cozida, mudubim torrado, banana madura; cozinharam bastante comida e nos ofereceram.

  1. Hatubetan pibai, hatubetan pikin, keyutan. Hanunkain, na hatube beyusi. Na hatube piaya kaai, na hatubetan baka wakin, hatubetan bai waiki, hatubetan yunu banakin, mani banakin, xeki banakin, atsa banakin, kadi banakin, yubon banakin, badan banakin, nixi badan banakin, pua banakin, tawa banakin, banakin, keyutan.

Com eles (nossos parentes) comemos longamente, brincamos, vamos caçar; com eles pescamos, matamos caça, fazemos o roçado. Plantamos legumes, bananeira, milho, macaxeira, batata-doce, inhame, mamoeiro, jerimum, cará, cana.

  1. Hatu betan yunu banakin, keyutan. Hanunkain, hiwe wakin, hiwe bena wakin, na hi sekekin, na hepe sekekin, keyutan.

Depois de plantarmos legumes, (agora) fazemos novas casas; cortamos paus, cortamos jarinas.

  1. Hatubetan xubu wakin, keyua. Hanunkain, ha medan hiwe, hatube beyusi, na uman txani, na txidim, na katxa waa, nawai.

Com eles (nossos parentes) fazemos casas e nelas moramos; com eles brincamos, convidamos (aldeões de diferentes comunidades) para dançarmos (juntos) o txirim e o katxa.

  1. Hatube beyuski, keyua, nun humiski, aki, nukun yuxindan.

Nossas almas (espíritos dos vivos) brincam com nossos parentes (com o espírito dos mortos).

  1. Nun haska waa, nun bestendan, nun hatu yuimiski, aki.

Nós fazemos assim e despertamos, nós lhe dissemos, disse.

  1. Nun namandan, ana wamaidan, ana uxaa. Hanunkain, mawa nanta nun nimiski, aki, nukun yuxindan.

Nós sonhamos, outra vez sonhamos, dormimos e agora nós (nossas almas) para muito longe andamos.

  1. Nukun yuxindan, nenu uxa dakaadan. Nukun yuxindan nukun paxkabaini, mawa nanta nixun, hamapai waibun, nun uinmiski, aki. Na detenameaibu, na tsakanameaibu, na kuxianameaibu uinkin, txatxinameaibu uinkin, na txutaabu uinkin, na puiaibu uinkin, na isunaibu uinkin, na mawaaibu uinkin, na sai ikaibu uinkin.

Nós dormimos deitados e nossas almas nos largaram, foram para muito longe; (nos sonhos) vemos as coisas ruins que nossos parentes fizeram: estes brigaram entre si, estes se flecharam, estes se espancaram; vemos se furarem, amarrarem-se pelos pescoço, afogarem-se no rio; vemos (nossos parentes) caírem, fornicarem, defecarem, mijarem; estes morreram, estes choraram gritando.

  1. Uinkin, keyua, nukun yuxin. Hanunkain, nukun yudaki nukun hikituxiaya nun besten imiski, aki, nukun yuxindan.

Agora nossas almas regressam aos nossos corpos, acordamos.

  1. Habia na nun kekemisdan.

Nós falamos enquanto dormimos.

  1. Uxa dakaa, nun kekemisdan, nukun yuxin-yuxin betsabe detenamei.

Deitados, nós falamos enquanto dormimos; nossas almas pelejam com outras almas.

  1. Nukun tetsundan, haska habe hantxatima, nun bis iki, nun imiski, aki.

Não podemos gritar com as outras almas, elas nos agarram pelo pescoço.

  1. Na nun kekeidan nukun deteabu, nukun kuxciabu, nukun txatxiabu, nukun tsakabu nun imis kiaki.

Estes (parentes), com os quais conversamos enquanto dormirmos, nos mataram, nos açoitaram, nos furaram e nos flecharam.

  1. Na nun uxa dakaa kekemisdan, bis iki, nun imiski, aki.

Deitados, nós falamos enquanto dormimos, gritamos.

  1. Nukun deteabu bis-bis iki, nun imiski, aki.

Gritamos, gritamos, (nosso parentes) nos matam.

  1. Kekeidan nama txakai nun imiski, aki kekeidan.

Se falarmos enquanto dormimos, sonhamos mal.

  1. Hakia na nun namai pemisdan, nama pe waai, nun kekeama imisdan.

Se não falarmos enquanto dormimos, sonhamos bem, teremos bons sonhos.

  1. Nun namaidan, nun haskamiski, aki. Nukun yuxin baidan nun haskamiski, aki.

Quando nós sonhamos é assim, nossas almas passeiam.

  1. Nun axa dakaa namaidan, namadan, nun haskamiski, aki.

Nós dormimos deitados e quando sonhamos, se sonhamos, fazemos assim.

  1. Na nun nama txakai, kekeadan, nun txai kainama imiski, aki.

Quando falamos dormindo, sonhamos mal; não saímos para longe de casa (de onde viemos).

  1. Na dayaama, na piayai kaama, na baka wama, txai niama itiki nama txakadan.

Não trabalhamos, não caçamos, não pescamos, não andamos para longe (quando sonhamos mal).

  1. Habin txai kainidan, piayai kaaidan, dayai kaidan, bakai wai kaidan, nama pe waitiki.

Porém, se tivermos bons sonhos, sairemos para longe, caçaremos, trabalharemos, pescaremos.

  1. Habin nama txakadan dayaama itiki.

Se sonharmos mal, não devemos trabalhar.

  1. Nukun yuxin namaidan, nun uxa dakaa, nun namaidan, nukun yuxindan haskamiski, aki.

Deitados, nós dormimos e sonhamos, assim faz a nossa alma.

  1. Nun namaidan, nun haskamiski, aki.

Quando sonhamos, fazemos assim.

 

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RÃ-TXA HU-NI-KU-Ĩ… A LÍNGUA DOS CAXINAUÁS DO RIO IBUAÇU, AFLUENTE DO MURU

Autor: João Capistrano de Abreu
Editoras: Unicamp e Unemat
Preço: R$ 104,00 (712 págs.)

 

 

 

 

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