cinema

Entre sonhos e filmes

9 maio, 2014 | Por Isabela Gaglianone

O Instituto Moreira Salles e o Sesc organizaram em 2012 a exposição que gerou este belo catálogo: Tutto Fellini. A publicação traz fotografias de bastidores, desenhos, revistas e cartazes de época, buscando revelar o processo criativo do cineasta italiano Federico Fellini. Nem cronológico, nem filmográfico, o catálogo procura seguir as quatro linhas temáticas que balizaram a exposição: “cultura popular”, “Fellini em ação”, “a cidade das mulheres” e a “invenção biográfica”. Uma busca pelas obsessões do diretor, bem como por suas fontes de inspiração, explorando as suas diferentes facetas, quer como devorador onívoro de imagens, admirador das mulheres, crítico da sociedade, realizador enérgico, como criador profuso.

Um interessante destaque são os registros que o diretor fez de seus próprios sonhos, durante 22 anos, aconselhado por um analista. Chamada de o Livro dos Sonhos, uma série de desenhos feitos por Fellini de 1960 a 1990 a partir de material sonhado por ele, nos quais há, inlcusive, cenas de delírio erótico.

Indispensável para pensar o cinema de Fellini, um aspecto ricamente explorado é seu envolvimento com a cultura popular. O melodrama típico das fotonovelas, por exemplo, sempre marcou seus filmes. Esse e outros elementos da sociedade italiana no pós-guerra são encontrados em sua obra e aqui mostrados: os desfiles religiosos ou políticos; os jantares (e a sátira ao excesso de espagueti); o circo, que pautou sua produção desde Mulheres e Luzes até Os palhaços (1970); a mídia – para seus filmes, Fellini produzia peças publicitárias que faziam uma paródia à sociedade italiana, como os outdoors de Ginger e Fred (1986); quadrinhos – a exposição exibe uma fotonovela com Marcello Mastroianni interpretando o papel de Mandrake, o Mágico (inspirado na história de Lee Falk) e também a HQ A viagem de Giuseppe Mastorna, projeto antigo do diretor para um filme nunca terminado publicado na revista Ciak, na década de 1990.

Há também uma seção dedicada à relação com a figura feminina, personificada de tantas diferentes maneiras, como mães, prostitutas ou divas ninfomaníacas, como personagens bizarras e excêntricas. Além de uma homenagem às atrizes que se tornaram divas através de seus filmes, como Anita Ekberg, Anna Magnani e Giulietta Masina, com quem Fellini se casou em 1943.

O livro conta com texto e notas de Sam Sturdzé, curador da exposição, diretor do Musée de l’Elysée, na Suíça. A tradução foi realizada por Cecília Ciscato e Samuel Titan Jr.

A exposição, bem como o catálogo, mostram que, em seus filmes, Fellini questionou limites entre real e imaginário, ficcional e biográfico, alta e baixa cultura, cinema de autor e de entretenimento; e que, com isso, conquistou uma liberdade criativa que gerou algumas das mais originais reflexões sobre o nosso tempo.

Segundo o curador, o objetivo foi “revelar o processo criativo de Fellini, mostrando quão genial ele foi ao traduzir o que via ao seu redor – a realidade foi uma grande fonte de inspiração, que ele transformou em fortes imagens cinematográficas”. O livro guarda curiosas histórias por trás dos clássicos, mostra os primeiros anos de vivência artística – como jovem cartunista, nos anos 30 – e depois como foram os primórdios de sua filmografia, pontua o uso de passagens da própria biografia em sua arte, como em Amarcord. Para Sam Stourdzé, é “muito importante continuar discutindo a obra e assistir à parte menos conhecida, como Ginger e Fred (1986) e Entrevista (87). Fazendo isso, fica fácil perceber que Fellini estava sempre fazendo o mesmo filme, o que é um grande elogio”.

 

É possível visualizar o livro aqui.

 

 

TUTTO FELLINI

Autor: Federico Fellini, textos de Sam Stourdzé
Editoras: Edições Sesc/ Intituto Moreira Salles
Preço: R$ 65,00 (184 págs.)

 

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