Arquivo da tag: Voltaire

Guia de Leitura

Textos cujo argumento crítico baseia-se no estranhamento

6 maio, 2015 | Por Isabela Gaglianone

O estranhamento é ferramenta imediata para análise: sobretudo sobre si próprio, individual ou socialmente. É, pois, instrumento retórico por excelência.

O olhar de estranhamento rebate-se num jogo de espelhos invertidos, desdobrando a noção do outro como analogia possível – tal o conceito de outridade de Octavio Paz, descrito no ensaio Signos em rotação; base de construção histórica, como vista por Carlo Ginzburg:  “Grandes olhos de madeira, por que olhais para mim?”.

 

Liev Tolstói, "O diabo e outras histórias"

Liev Tolstói, “O diabo e outras histórias”

Tolstói, com seu conto Kholstomer, aborda, suscitado-os a partir de um estranhamento irônico, aspectos fundamentais de sua crítica à sociedade de sua época, às contradições do capitalismo e das noções de propriedade privada e a posse.

Kholstomer é um cavalo puro-sangue, porém malhado, razão que faz com que seu dono o mande castrar, para não prejudicar a raça. Por ser malhado, o cavalo também é alvo de ridicularização e de desprezo pelos outros cavalos, conta Tolstói que “o motivo da crueldade dos cavalos devia-se também a um sentimento aristocrático”, pois o malhado tinha origem desconhecida. O conto constrói uma metáfora que caracteriza as relações sociais da época.

Ao próprio cavalo, o estranhamento – espelho de efeito crítico ácido – é ser posse humana: “[…] mas, naquele momento, não houve jeito de entender o que significava me chamarem de propriedade de um homem”; para Kholstomer, a expressão “meu cavalo”, referindo-se a ele, reflete-lhe tão estranhamente quanto “minha terra” e “minha propriedade”.

Ao passo que ele reflete sobre o significado dessas “palavras confusas”, percebe a vastidão de sua aplicação conceitual: “mais tarde, depois que ampliei o círculo das minhas observações, convenci-me de que, não só em relação a nós, cavalos, o conceito de “meu” não tem nenhum outro fundamento senão o do instinto vil e animalesco dos homens, que eles chamam de sentimento ou direito de propriedade”. Sua interessante conclusão, é que a orientação humana não é dada pelas ações, senão pelas palavras.  Continue lendo

Send to Kindle
matraca

Verdade, crítica e censura

13 novembro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

O livro Filosofia clandestina: Cinco tratados franceses do Século XVIII é uma antologia de pequenos tratados, publicados de maneira clandestina e anônima, por seu conteúdo crítico – anticlericais, críticas políticas e defesas de novas concepções de mundo. A seleção, apresentação e tradução dos textos foi feita por Regina Schöpke, doutora em filosofia e medievalista, e por Mauro Baladi, graduado em filosofia pela UERJ. O livro foi publicado pela editora Martins Fontes.

O primeiro texto, “O verdadeiro filósofo“, de César Chesneau du Marsais (França, 1676-1756), defende um novo papel desempenhado pela filosofia no Iluminismo, incentivando o fornecimento, através dela, de intervenções favoráveis na formação crítica da população, rejeitando o caráter puramente metafísico da reflexão. Continue lendo

Send to Kindle