história

Triste visionário

30 junho, 2017 | Por Isabela Gaglianone

Lima Barreto, fotografia de 1909

Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1922), grande escritor brasileiro, cuja vida foi perpassada por dificuldades por ser mulato e filho de uma família pobre, será o homenageado da Festa Literária de Paraty neste ano.

Lima Barreto soube justamente retratar criticamente as injustiças sociais do Brasil e o preconceito de cor do qual também foi vítima, nascido em um país que aboliu a escravidão no exato dia em que o ainda futuro escritor completava sete anos, em 13 de maio de 1888 – mesmo ano em que ficou órfão de mãe. Sua literatura não foi reconhecida durante sua vida. Lima Barreto é conhecido por ter tido uma vida boêmia, solitária e entregue à bebida, pelo que foi internado duas vezes na Colônia de Alienados na Praia Vermelha, em razão das alucinações que sofria durante seus estados de embriaguez. Morreu na pobreza, na doença e no esquecimento.

Durante mais de dez anos, Lilia Moritz Schwarcz mergulhou na obra desta interessantíssima figura da literatura brasileira. Seu profundo estudo biográfico, Lima Barreto: triste visionário, que alia seus olhares historiográficos e antropológicos e abrange o corpo, a alma e os livros do escritor, acaba de ser lançado pela Companhia das Letras.

Trata-se da mais completa biografia de Lima Barreto desde o trabalho pioneiro de Francisco de Assis Barbosa – lançado em 1952 – e busca compreender a trajetória do biografado sobretudo sob o ponto de vista da questão racial, ainda pouco discutida nos trabalhos sobre sua vida, abarcando a íntegra dos livros e publicações na imprensa, além dos diários e de outros papéis pessoais de Lima Barreto, muitos deles inéditos.

Lilia Moritz Schwarcz tem uma rara sensibilidade para as sutilezas que permeiam as relações entre contexto biográfico e criação literária. Mostra Lima Barreto como escritor militante, como ele mesmo se definia, que professou ideias políticas e sociais à frente de seu tempo, com críticas contundentes ao racismo e outros paradoxos sociais crônicos brasileiros. A edição que vem a lume é generosamente ilustrada com fotografias, fac-símiles de manuscritos e de outros documentos originais.

Conforme pontua Leonardo Cazes, em artigo publicado no Jornal O Globo, Lima Barreto, ao mesmo tempo que teve uma educação formal destinada apenas a poucos, “viveu a ascensão do racismo científico, que vinculava raça e degeneração. Apesar das críticas a esses pensadores, que constavam na sua biblioteca, o escritor viu o pai enlouquecer e ‘confirmar’ as teorias que tanto combatia. Ele próprio seguiu o mesmo caminho, derrotado pelo alcoolismo e carregando em si as contradições de seu tempo. Para Lilia, foi ‘triste e visionário’, tal como ela coloca no título de sua biografia, lançada após mais de dez anos de pesquisas”. No mesmo artigo, há uma entrevista, concedida pela autora a Cazes, na qual fala de uma das principais perguntas que a motivaram a fazer a pesquisa: “Por que, num momento em que a questão racial no Brasil era quase um interdito, o Lima fez uma literatura afirmadamente negra? No livro todo, tento mostrar como ele usa a cor. A questão da raça é fundamental para o Lima numa época em que temas como pan-africanismo ou associativismo negro não eram temas da agenda brasileira. Esta biografia é uma volta ao escritor por uma janela diferente, do nosso tempo”. Lilia Schwarcz conta ainda: “Procurei trazer um Lima complexo, com as suas ambiguidades, um Lima mais humano. Ele é contra a Academia Brasileira de Letras, mas quer entrar nela. É profundamente impactado pelos subúrbios, mas se diferencia, destaca que tem uma educação diferenciada do resto dos moradores. É muito bonito, ele está sempre deslocado. No Centro, ele é do subúrbio, no subúrbio ele é de outro subúrbio. Lima critica os bovarismos, mas é um leitor dos russos, evoca Dostoiévski o tempo todo. Por isso inscrevi essa ambiguidade no título do livro, ao combinar duas palavras que, dariam em casamento litigioso”.

Em outra entrevista, concedida a Ubiratan Brasil, para o jornal O Estado de S. Paulo, questionada sobre o fato de ele ser negro e não ter recursos ter ou não contribuído para a dificuldade em não ser aceito, Lilia Schwarcz diz: “Contribuiu e ele também agenciou muito isso, a partir da ideia de que não é um figurante passivo – vai construir sua persona. Parte dessa construção é de um Lima Barreto que faz um Rio de Janeiro mais amplo, que inclui o centro e os subúrbios, onde ele vivia. Ele sempre morou em Todos os Santos. Então, a partir desse trajeto pelo trem da Central do Brasil, Lima descreve a pobreza com imensa dignidade, assim como observa a aristocracia do subúrbio com muito escárnio, concentrada sobretudo em Botafogo e Méier, bairros que desprezava solenemente. Lima foi uma pessoa pobre, mas de uma classe média de funcionários públicos do Rio de Janeiro. Ele era um amanuense paradoxal – o amanuense redige cartas e ele tinha uma letra péssima”. Segundo a autora, Lima Barreto “trouxe a questão da cor para o primeiro plano, sobretudo nesse momento, início do século 20, quando era assunto secundário. Ele trouxe para frente, sobretudo nas crônicas, nas quais fez uma denúncia muito forte e fundamental contra o racismo existente no Brasil. Lima não chamava de racismo institucional, como hoje chamamos, mas já diagnosticava como pós-abolição, um momento que ele viveu. Um momento em que se tentou perpetuar as diferenças pautadas primeiro numa instituição perversa, como era a escravidão, e depois na cor da pele. Ele mesmo se descrevia da cor de uma azeitona escura, uma forma de usar essa régua da cor social que, ao mesmo tempo, pode incluir, mas também é exclusivista e cria uma série de discriminações”. Sobre a produção literária do escritor, Schwarcz diz, ainda na mesma entrevista: “No pouco tempo de vida, tão difícil, ele produziu romances fundamentais, e ainda tinha muitos projetos no bolso. Um livro que anuncia e escreve poucos capítulos é Cemitério dos Vivos. Lima dizia que seria o seu livro fundamental, um livro na veia mesmo, porque tratava da sua experiência em 1914 e 1919, quando foi internado no hospício. O personagem é Vicente Mascarenhas. Aliás, todas as personagens de Lima são ele mesmo, porque ele vive assombrado por esses seres. O que me parece é que Cemitério dos Vivos era um projeto fundamental e esse personagem era um reflexo do Lima: bebia muito e também se internara. Seria um livro maravilhoso, que tratava dessa realidade que Lima descreve como ninguém. Ele diz no manicômio: todos são negros, em uma época em que se criava um projeto constitucional. Lima ironizava ao dizer no romance: vocês acreditam que a Constituição é para vocês? Não é. Vinha aí um romance fundamental”.

André de Oliveira, em artigo publicado na edição brasileira do jornal El país, fala sobre a questão do “branqueamento” do escritor, sobretudo pelas fotografias de época, mas também em contradições em seus registros: “No topo da ficha da primeira internação de Affonso de Henriques de Lima Barreto no Hospício Nacional, o escritor é identificado como branco. O ano era 1914, o diagnóstico alcoolismo, a cidade Rio de Janeiro. Logo abaixo do cabeçalho, contudo, uma foto em sépia desmente a informação sobre sua cor. Assim como um sem número de intelectuais e homens públicos brasileiros, que eram negros, mas foram repetidamente retratados como brancos, Lima, ainda em vida, foi tomado pelo que não era. No seu caso, contudo, o “branqueamento” é ainda mais absurdo, pois ser negro, no último país a abolir a escravidão no mundo, foi questão central da vida e obra do escritor brasileiro”. Oliveira conta que: “Em 1919, quando foi internado pela segunda vez no Hospício Nacional, Lima já era descrito como alguém andrajoso, com os sapatos trocados, transpirando muito, com inchaços no rosto e olhos ‘sampaku’ – quando há um branco abaixo da íris, característica comum ao alcoolismo. Três anos depois morreu deitado em sua cama, enquanto lia uma revista francesa. Nessa época, Schwarcz descreve, sua personalidade estava se fundindo, cada vez mais, com a dos sofridos moradores dos subúrbios – tão retratados em seus textos. Lima, segundo a biógrafa, é nosso visionário por ter falado de racismo praticamente cem anos antes do assunto entrar, de fato, em pauta. É nosso visionário também por ter antecipado uma série de temas brasileiros, como a urbanização pouco planejada das cidades. É triste por saber também, de antemão, que a coisa não ia bem e que a euforia dos anos em que viveu – era o tempo da Belle Époque, em que o avanço científico e o crescimento das cidades dava a sensação de que os problemas da humanidade estavam resolvidos – não iria durar”.

 

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Trecho

 

Não é correto imaginar que o modernismo brasileiro se restringisse à Semana de 1922. No entanto, coube ao grupo paulista catalisar a primeira percepção desse momento em que ideias, contestações e anseios se achavam dispersos pelo país. O marco simbólico se deu de 11 a 18 de fevereiro de 1922, quando São Paulo sediou, no vistoso e neoclássico Teatro Municipal, localizado no centro da cidade, uma Semana de Arte Moderna promovida por intelectuais e escritores do calibre de Mário de Andrade e Oswald de Andrade, pelos artistas Di Cavalcanti, Anita Malfatti e Victor Brecheret, pelo músico Heitor Villa-Lobos, entre outros. [nota 1] Graça Aranha, ele próprio membro da Academia, foi também um dos organizadores do evento, assim como o intelectual e cafeicultor Paulo Prado, que ajudou a financiar as atividades. Em pauta estava a crítica à importação indevida de movimentos artísticos e teorias estrangeiras, propondo-se a introdução de modelos mais locais. O intento era renovar o ambiente cultural, adotando experiências estéticas de vanguarda que agitavam a Europa — como o futurismo, o cubismo, o expressionismo —, mas fazendo uso de “régua e compasso” brasileiros.

A nova agenda modernista tinha pontos comuns com aquela de Lima. Afinal, ele também andava preocupado, havia muito, em contestar o parnasianismo, as linguagens estetizantes e pautadas apenas na forma; era expressamente contrário à adoção, sem a adaptação necessária, de linguagens estrangeiras que dominavam a literatura nacional. Já em 9 de julho de 1906, em carta a Noronha Santos, o autor de Policarpo debochava: “Je pretendo go sunday, 16, vers Rio de Janeiro. Eu can’t remain plus Inconfi dentes, because molto insípido […] You pode to end de envoyer newspapers for moi. Muchas gracias a usted. Responda: non se merece. farwell [sic] et eu believe arriver in Rio (Cascadura) seventeen, at seven o’clock a. m.”. [nota 2]

Mas na época os 359 quilômetros que separam o Rio de Janeiro de São Paulo levavam pelo menos doze horas para serem percorridos por trem. Para que se possa ter uma ideia, na década de 1920 “a Central do Brasil mantinha diariamente dois trens rápidos e quatro trens noturnos” circulando entre o Rio e São Paulo. A distância geográfica e a reduzida oferta de transportes públicos permitem, portanto, encontrar uma primeira explicação do motivo por que podiam ser difíceis e pouco frequentes as comunicações entre os grupos literários paulista e carioca. Além do mais, é forçoso reconhecer que, nos idos de 1922, o movimento modernista paulistano ainda não era muito reconhecido ou comentado para além do estado.

[…]

Dizem que Sérgio Buarque de Holanda, que também participava do grupo dos modernistas paulistanos e da revista Klaxon mas na época morava no Rio, mantinha relações distantes, ainda que cordiais, com o colunista da Careta Lima Barreto [nota 3]. Aliás, os dois grupos tinham muito em comum, embora pudessem não se dar conta disso. Lima era totalmente contra a “mania grega” que tomara a capital, e buscava dar oralidade a seus textos — e assim se aproximar da linguagem popular. Mais: sabemos que o autor de Policarpo Quaresma costumava ser generoso com os novos escritores, animando-os na profissão. Dessa vez, porém, não foi assim.

Na verdade, estava para acontecer um acidente que marcaria a sorte de Lima com o grupo da Klaxon. Quando recebeu a revista, entregue por Sérgio Buarque, o escritor carioca, que cumpria o papel de crítico literário das novas gerações de escritores, reagiu de pronto, revelando seu célebre escárnio [nota 4]. Avaliou que a publicação devia muito ao futurismo italiano e, quem sabe, implicou com “os rapazes”, a quem provavelmente julgou burgueses e muito paulistas. [nota 5]

História de “se” não existe. Ou seja, se Lima tivesse juntado dois mais dois; se tivesse sido capaz de superar sua primeira opinião sobre a capa modernista da publicação dos paulistas; se tivesse conseguido reconhecer nas novas gerações anseios semelhantes, ou ao menos afinados, aos que ele descrevera em seu “manifesto” de 1921 — intitulado “O destino da literatura” [nota 6]—, talvez a história fosse outra. Mas não houve tempo, e o que ocorreu lembrou o estrondo e as consequências de uma trombada.

Lima achou que os “moços de São Paulo” tinham jeito de bovaristas [nota 7] e que andavam animados demais com as ideias de Marinetti. Já eles, na resposta divulgada no número seguinte da publicação, fizeram pouco-caso das avaliações do “herbolário carioca”. Pensaram que só podia ser coisa de gente da capital. Se 1922 deu a impressão de que iria se abrir como um ano de encontro, foi ano de fim.

[…]

Em artigo para a Careta de 22 de julho de 1922, intitulado “O futurismo”, [nota 8] Lima alfinetou: “São Paulo tem a virtude de descobrir o mel do pau em ninho de coruja. De quando em quando, ele nos manda umas novidades velhas de quarenta anos. Agora, por intermédio do meu simpático amigo Sérgio Buarque de Holanda, quer nos impingir como descoberta dele, São Paulo, o tal de ‘futurismo’”. É certo que se referiu de forma “cordial” a Sérgio Buarque, mas seguiu em frente em tom nada cauteloso. “Ora, nós já sabíamos perfeitamente da existência de semelhante maluquice, inventada por um Senhor Marinetti […]. Assim sendo, vejam os senhores como esse ‘futurismo’ é mesmo arte, estética do futuro.”

E o sabor azedou de vez: “Recebi, e agradeço uma revista de São Paulo que se intitula Klaxon. Em começo, pensei que se tratasse de uma revista de propaganda de alguma marca de automóveis americanos. Não havia para tal motivos de dúvidas porque um nome tão estrambótico não podia ser senão inventado por mercadores americanos, para vender o seu produto. Quem tem hábito de ler anúncios e catálogos que os Estados Unidos nos expedem num português misturado com espanhol, sabe perfeitamente que os negociantes americanos possuem um talento especial para criar nomes grotescos para batizar as suas mercancias”.

[…]

Talvez o autor carioca tenha se irritado com o estilo da revista; quem sabe demonstrava com o texto a sua contrariedade com o que julgava ser a elite paulistana; ou pode ser que intentasse passar lições de escritor mais velho para os mais jovens; ou tudo junto. O fato é que, depois de desdenhar dos “moços”, ele recuou um pouco e tentou selar uma paz: “O que há de azedume neste artiguete não representa nenhuma hostilidade aos moços que fundaram a Klaxon; mas sim, a manifestação da minha sincera antipatia contra o grotesco ‘futurismo’, que no fundo não é senão brutalidade, grosseria e escatologia, sobretudo esta. Eis aí”. O juízo pode ter sido um pouco rápido, como eram muitas vezes apressados os artigos de Lima, especialmente naquele ano de 1922, em que, preocupado com as finanças da família, ele produzia crônicas como quem entregava pãozinho quente de manhã. Mas era tarde: a provocação pegou forte nos “moços”, que não gostaram da pecha de futuristas nem de serem definidos, e duas vezes, como jovens e pouco maduros.

 

Trecho divulgado pelo Suplemento Pernambuco, em 24 de junho de 2017.

As notas são, em sua maioria, de autoria de Lilia Schwarcz e, algumas, sinalizadas abaixo, de autoria do corpo editorial do Suplemento:

 

NOTAS

[nota 1] Para um bom balanço da Semana de 1922, ver, entre outros, Nicolau Sevcenko, Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20 (São Paulo: Companhia das Letras, 1992); e Marcos Augusto Gonçalves, 1922: A semana que não terminou (São Paulo: Companhia das Letras, 2012). Agradeço a este último autor pelas indicações que me passou.

[nota 2] Apud Antonio Arnoni Prado (Org), Lima Barreto: Uma autobiografia literária. São Paulo: Editora 34, 2012

[nota 3]: Nota do Suplemento Pernambuco – Lima Barreto colaborou com a revista Careta em 1915 e entre 1919 e 1922.

[nota 4]: Tratei [Lilia Schwarcz] dessa feição de crítico literário de Lima Barreto no texto “Como ser do contra e a favor: Impressões de leitura e muito mais”, que escrevi para o livro organizado por Beatriz Resende, Impressões de leitura e outros textos críticos (2017).

[nota 5]: O futurismo foi um movimento estético e político surgido em 20 de fevereiro de 1909 com a publicação do “Manifesto do futurismo”, de Filippo Tommaso Marinetti, no jornal Le Figaro. Tal movimento pretendia romper com o passado, visando a construção de uma nova sensibilidade estética capaz de refletir as profundas transformações sociais decorrentes do desenvolvimento industrial e tecnológico. Ver Richard Humphreys, Futurismo, trad. de Luiz Antônio Araújo (São Paulo: Cosac & Naify, 2001); Annateresa Fabris, O futurismo paulista: Hipóteses para o estudo da chegada da vanguarda ao Brasil (São Paulo: Perspectiva, 1994); Annateresa Fabris, Futurismo: Uma poética da modernidade (São Paulo: Perspectiva; Edusp, 1987); e Aurora Fornoni Bernardini (Org.), O futurismo italiano (São Paulo: Perspectiva, 1980).

[nota 6]: Nota do Suplemento Pernambuco (síntese do que escreveu Lilia Schwarcz) – Em 1921, Lima Barreto fraturou a clavícula enquanto estava ébrio. No hospital, conheceu o médico Ranulfo Prata, também escritor, com quem firmou amizade. Prata tinha uma casa em Mirassol, interior de SP, e julgou que lá o criador de Policarpo Quaresma poderia se recuperar de sua relação destrutiva com o álcool. Lima se animou e foi para a Mirassol, onde foi recebido como autoridade. Lá, os amigos de Prata o convidaram para proferir uma palestra em São José do Rio Preto, a poucos quilômetros dali. A iniciativa não fez bem ao escritor carioca, que não gostava de se expor em público e aceitou para não fazer desfeita. Logo começou a demonstrar sinais de ansiedade e agitação, mas redigiu seu discurso – intitulado O destino da literatura. Segundo Lilia Schwarcz (Lima Barreto: triste visionário, p. 439), “mal sabia o autor carioca que o artigo se converteria numa espécie de testamento de sua obra — num balanço e numa defesa de sua literatura militante”. O único site no qual localizamos a íntegra do texto é o deste link (não quer dizer que não haja outros).

No dia da palestra em São José do Rio Preto, Lima Barreto não apareceu. Após procura-lo por Mirassol, Ranulfo Prata o achou dormindo na sarjeta, bêbado. O discurso, jamais proferido oralmente por seu autor, seria publicado na Revista Santa Cruz em fins de 1921.

[nota 7]: Nota do Suplemento Pernambuco – Bovarismo é um termo cunhado por Jules de Gaultier (1858 – 1942) para falar da disposição do homem a conceber-se diverso do que é, a mentir para si mesmo. Essa ideia “estende a caracterização do drama individual da personagem flaubertiana, Madame Bovary, para a caracterização das nações”, segundo a pesquisadora Eliana Souza. De acordo com Nicolau Sevcenko (em Literatura como missão), citado por Eliana Souza, o bovarismo “era outra dessas atitudes mistificatórias características da nova elite e prenhe de graves consequências para o conjunto do país. Esse tema constitui o âmago mesmo do Policarpo Quaresma, formando ainda a fonte de contos como ‘A biblioteca’, ‘Lívia’ e ‘Na janela’”.

[nota 8]: Lima Barreto, “O futurismo”. Careta, Rio de Janeiro, ano XV, n. 735, 22 jul. 1922. In: Beatriz Resende e Rachel Valença (Orgs.), Lima Barreto: Toda crônica — Volume 2, 1919-1922, op. cit., pp. 538 -9. Adendo do Suplemento Pernambuco: todas as aspas do parágrafo no qual figura esta nota e dos dois parágrafos seguintes são desta fonte.

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LIMA BARRETO – TRISTE VISIONÁRIO

Autor: Lilia Moritz Schwarcz
Editora: Companhia das Letras
Preço: R$ 52,43 (656 págs.)

 

 

 

 

 

 

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