Referência literária colombiana, Andrés Caicedo (1951-1977) recebe pela primeira vez uma edição brasileira: Viva a música! chega às livrarias pela editora Rádio Londres.
Foi o único romance publicado por Caicedo, mas ainda assim responsável por uma revolução na produção literária da Colômbia. O jornal colombiano El espectador elegeu-o o segundo romance mais relevante do país no século XX, logo após Cem anos de solidão, de Gabriel García Marques.
O romance, publicado originalmente em 1977, é narrado por uma garota loira, rica e obcecada por música, que vive por e para música, da qual desfruta ao abandonar as convenções sociais e lançar-se numa vida de festas e drogas na noturna Cáli da década de setenta.
A estratégia narrativa do autor é apresentar as ações através da narradora protagonista, deixando assim ao leitor o trabalho interpretativo e reflexivo.
Viva a música! capta as ambiguidades e as crises culturais, não somente da Colômbia, mas da América Latina, com sutileza e um impacto avassalador. O romance é um dos mais relevantes textos de caráter político de sua época.
Segundo Wilson Alves Bezerra, escritor e professor da UFSCAR, em resenha escrita ao jornal O Estado de São Paulo, os elementos que marcam o romance são “paixão, fragilidade e, sobretudo, urgência”. Para Bezerra, “suas linhas exalam um saboroso imediatismo”; diz o crítico: “Produzindo literatura urbana e jovial, Caicedo afasta-se radicalmente do encantamento pela selva que produz o já então celebrado García Marques (1927 – 2014), e dá mostrar de ter bebido muito na psicodelia e na literatura beat. O rock, o cinema e outras referências da cultura pop são também centrais para as experiências vitais da personagem, mais que isso, são o amálgama de suas descobertas e lhe conferem sentido”.
Raquel Cozer, em artigo escrito à Folha de São Paulo, conta que Caicedo escreveu Viva a Música! “antes dos 23 anos. “Ele sabia que tinha feito algo importante”, diz a irmã Rosario Caicedo, 64. Em 4 de março de 1977, aos 25, ele recebeu a primeira cópia da edição feita pela Colcultura. Horas depois, caiu morto sobre sua máquina de escrever, após ingerir 60 pílulas de sedativo. O romance explicava: ‘Antecipe a morte, marque um encontro com ela. Ninguém quer saber de crianças envelhecidas’, diz a narradora, já perto do fim. ‘Se você deixar uma obra, morra tranquilo, confiando em uns poucos bons amigos’”.
Segundo resenha do escritor Joca Reiners Terron, publicada também na Folha de São Paulo, o livro “é desses raros instantes em que a realidade invade a literatura, arrastando a ficção pelo colarinho a um mundo desconhecido. A música, desde o título, não é pouca no romance de Andrés Caicedo: do ritmo oral que turbina a voz da adolescente María del Carmen à festa infinita de Cáli, cuja trilha sonora não passa de desespero e violência descontrolada rumo ao fim da noite”. Terron analisa: “Pedra angular da ficção hispano-americana recente, influência de figuraças do século 21 como o argentino Washington Cucurto e seu realismo “atolondrado” (descuidado), “Viva a Música!” prova que a noite, “acúmulo de substâncias negras fuliginosas na atmosfera” (como disse dr. De Selby, criação do irlandês Flann O’Brian), é também soma desesperada de alegrias que implodem na mais incontornável tristeza”.
Andrés Caicedo foi uma das vozes mais inteligentes, lúcidas e intensas de seu tempo. Um autor frenético que, ao longo de uma carreira de cerca de dez anos, publicou inúmeras críticas de cinema, escreveu contos, peças de teatro, roteiros de cinema que jamais foram filmados, editou, em Cali, a revista de cinema mais influente da Colômbia, “Ojo al cine”.
O romance chega ao Brasil ao mesmo tempo em que o filme baseado no livro, dirigido por Carlos Moreno, chega ao festival de Sundance.
Autor: Andrés Caicedo
Editora: Rádio Londres
Preço: R$ 29,90 (220 págs.)