Paul Klee foi um artista revolucionário. Suas obras possuem um humor seco, ao mesmo tempo inventivo e também mágico, que, aliado à perspectiva abstrata, as preenchem com uma singular musicalidade. Seu trabalho penetra o inconsciente, a infância, é singularmente lúdico, desvenda a absoluta subjetividade da arte. Seu objetivo não era representar, mas visualizar: evitando a mera transposição, para a formalidade de uma linguagem, daquilo que se traduz em fenômeno na realidade, substituiu com refinamento gráfico único a compreensão dos objetos em sua consistência maciça pela materialidade ambígua do signo, frágil e incorpórea. A imagem, em seu trabalho, transmite-se em sua subjetividade absoluta.
O crítico de arte Giulio Carlo Argan, no livro Arte moderna, analisa: “[…] inteiramente dedicado a perscrutar as profundezas do ser para captar as raízes primeiras e mais secretas da consciência, Klee nunca sucumbe à vertigem […]. Não traduz a imagem em conceito, o que equivaleria a destruí-la; limita-se a torna-la visível, pois a percepção já é consciência”.
Tão talentoso quanto pintor, Klee também o foi enquanto músico. E é sobretudo interessante o entroncamento único, entre música e pintura, por ele desenvolvido e que representa a tônica de sua fabulosa expressão artística. Violinista, transformou sua leitura dos ritmos e estruturas musicais em arte abstrata: sua sensibilidade musical, bem como conhecimentos de composição de harmonia e melodia na música, foram significativos em seus trabalhos pictóricos. Considera-se que algumas de suas paisagens abstratas, por exemplo, feitas na década de vinte, foram tratadas à guisa de partituras, em que as cores localizadas fariam às vezes de notas, sobre linhas horizontais, que aludiriam a pentagramas.
Como professor da Bauhaus, Klee escreveu textos e livros e converteu alguns de seus métodos e lógicas artísticas em teorias ou projetos didáticos. Conseguiu, assim, demonstrar, também através de seus textos, parte da dimensão de acontecimento – artístico e filosófico – que cada um de seus quadros ou desenhos problematiza – problemas interpretativos, sem a pretensão de resolução. Um de seus livros, infelizmente sem tradução para o português é o fascinante Painting Music. Nele, Klee desenvolve reflexões sobre o entroncamento entre pintura e música. Sua analogia baseia-se principalmente em princípios rítmicos musicais, os quais, em sua opinião, marcam a movimentação da arte, à maneira que o fazem na música.
“A arte não reproduz o visível, mas torna visível” [Klee, in: CHIPP, Teorias da arte moderna].
Autor: Paul Klee
Editora: Prestel
Preço: R$ 46,90 (112 págs.)
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Notas:
1. Traduzido no Brasil, de autoria do artista, há o livro Sobre a arte moderna, publicado pela editora Zahar. Nele, são reunidos ensaios escritos por Klee acerca da função da pintura moderna. Discorre também sobre as relações da pintura com a música, bem como com a matemática, com a poesia e com a biologia. O livro contém também curiosidades, como a tradução do texto “Sobre a Luz”, de Delaunay, feita por Klee; o “Currículo” escrito pelo pintor para solicitar a cidadania suíça; algumas notas e referências a seus Diários. Há também nesta edição, textos de Rilke e de Kandinsky sobre Klee, além do prefácio, escrito por Günther Regel. Sobre sua relação com a música, Rilke, em 1921, escreveu que, mesmo se não soubesse que Klee tocava violino, teria adivinhado que seus desenhos eram transcrições musicais.
Autor: Paul Klee
Editora: Zahar
Preço: R$ 34,90 (128 págs.)
2. A Tate Galery, em Londres, dedica sua exposição “outonal” a uma retrospectiva de Paul Klee. Entitulada “The EY Exhibition: Paul Klee – Making Visible”, a exposição conta com desenhos, pinturas e aquarelas e propõe-se a homenagear a originalidade do artista. Ficará aberta até início de março do ano que vem: http://www.tate.org.uk/whats-on/tate-modern/exhibition/ey-exhibition-paul-klee-making-visible