história

Pelas fronteiras coloniais

26 maio, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Manuscrito de Francisco José de Lacerda e Almeida

O livro Francisco José de Lacerda e Almeida – Um astrônomo paulista no sertão africano é um interessante estudo sociológico, antropológico, histórico e biográfico, realizado por Magnus Roberto de Mello Pereira e André Akamine Ribas.

Lacerda e Almeida, como muitos brasileiros no século XVIII, estudou na Universidade de Coimbra, na qual estudou Matemática e Astronomia. Assim que se formou, foi contratado pela coroa para integrar a comissão de demarcação das fronteiras entre os territórios americanos de Portugal e Espanha, pelo que passou dez anos no Mato Grosso. Lacerda e Almeida posteriormente voltou a Portugal, onde se tornou professor de astronomia; em 1797 foi incumbido de atravessar a África, de Moçambique a Angola. Morreu no sertão africano, sem conseguir cumprir sua missão. A demarcação das fronteiras da América do Sul e a expedição de travessia da África estão entre as maiores aventuras científicas do século XVIII.

Segundo Ronald Raminelli, professor do departamento de História da UFF, em artigo publicado na revista História, o Tratado de Madri criou “mais controvérsias que orientações espaciais. A vasta dimensão do interior americano estava além da capacidade das partidas ibéricas. Os cartógrafos e os matemáticos defrontaram-se com uma geografia complexa e não chegaram a consensos. […] Majoritariamente, as novas comissões contavam com cartógrafos, astrônomos e matemáticos portugueses. A competência para os ofícios técnicos era resultado da reforma da Universidade de Coimbra e do encantamento dos jovens, particularmente dos luso-brasileiros, com o avanço da ciência nos domínios ultramarinos. Com título de doutor em matemática, atuavam como astrônomos e cartógrafos da partida portuguesa: José Simões de Carvalho, José Joaquim Vitório da Costa, Francisco Lacerda e Almeida e Antônio Pires Pontes Leme. […] O conhecimento e registro de plantas e animais novos, assim como a descrição e localização de minas de ouro e diamantes, eram também interesses da expedição. Em dez anos, Lacerda e Almeida percorreu as fronteiras, entre Belém e Santos, demarcou latitudes, viabilizou o trabalho dos cartógrafos e, finalmente, traçou o “Plano Geográfico do Rio Negro” de 1780”. O professor pontua que, comparado ao da América, o conhecimento geográfico das conquistas africanas não avançou na mesma proporção. Segundo ele, “Por volta de 1798, como governador dos rios Sena e Tete, o matemático Francisco de Lacerda e Almeida recebeu a tarefa de demarcar o sertão africano, em uma expedição rumo às terras ocidentais, de Moçambique a Angola ou a Benguela. Investido do plano de criar caminhos entre as possessões de Sua Majestade, o secretário de Estado Souza Coutinho pretendia impedir a presença de nações europeias, particularmente a inglesa, no interior africano. Durante a travessia, o matemático deixou registrada a falta de incentivo do governo metropolitano e o eminente fracasso de seus empreendimentos. Lacerda e Almeida logo morreria, vítima de doenças endêmicas. De todo modo, pouco antes da sua expedição, a cartografia de Angola e Benguela teve significativa melhora. Logo no início da década de 1790, o tenente-coronel Pinheiro Furtado empregou cartas e dados disponíveis para compor um mapa de Angola. No mapa de 1790, somente a costa oeste estava delimitada; na outra direção, “o espaço angolano não apresentava fronteiras definidas e o seu interior é ainda mal preenchido, quer no plano do conhecimento geográfico, quer no plano da ocupação política”. Enfim, a demarcação dos limites não tinha a mesma proporção da executada nas fronteiras entre a América portuguesa e espanhola. Nas colônias africanas, as demarcações não contavam com as precisas observações astronômicas e produziram, então, enquadramentos deficientes da rede fluvial. Manuel Galvão da Silva, Joaquim José da Silva, Carlos José dos Reis e Gama e Francisco José Lacerda e Almeida produziram inventários do continente que intentavam divulgar sugestões para melhorar o cultivo da terra, a pacificação dos povos e a busca de metais preciosos, mas não conseguiram aproximar as conquistas africanas de Lisboa. Sob o pretenso controle do monarca luso, o comércio com a África era, porém, “cada vez mais brasileiro e menos português”.

 

 

 

FRANCISCO JOSÉ DE LACERDA E ALMEIDA – UM ASTRÔNOMO PAULISTA NO SERTÃO AFRICANO

Autores: Magnus Roberto de Mello Pereira e André Akamine Ribas
Editora: Editora UFPR
Preço: R$ 115,00 (803 págs.)

 

 

 

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