Um livro dedicado a realizar uma retrospectiva do trabalho da artista plástica Laura Vinci. Dedicada ao desenvolvimento de instalações desde 1997, a artista tem como um dos fios condutores de seu trabalho reflexões sobre o tempo e a transitoriedade, quer da própria matéria, quer enquanto reflexão histórica e consequente maneira de pensar a contemporaneidade.
Editado pela Coscnaify, o livro apresenta, além das monumentais instalações exibidas em importantes museus e centros culturais, também as mais relevantes intervenções feitas pela artista em espaços públicos. Laura Vinci enfatiza a transitoriedade presente nos trabalhos através de legendas aos registros fotográficos; ela diz: “A maioria dos meus trabalhos tem movimento, como a areia que cai ou a água que se evapora. A legenda vem para explicar esses acontecimentos, já que a fotografia não dá conta disso”. O volume conta com textos dos críticos Lorenzo Mammì, Rodrigo Naves, Paulo Sérgio Duarte e Taísa Palhares e também apresenta uma entrevista, realizada por Guilherme Wisnik e Luisa Duarte, em que Laura conta alguns aspectos pouco conhecidos de sua trajetória artística.
Em 2007, Laura Vinci despertou um debate entre artistas e críticos com seu trabalho “Ainda Viva”. A instalação gerou uma discussão sobre a concepção de arte que, como analisou a crítica literária Viviana Bosi, retomou “argumentos empregados nas décadas de 60 e 70 contra (ou a favor de) uma transformação na arte voltavam à baila, atualizados, retomando teorizações de Mário Pedrosa (crítico de arte), Hélio Oiticica e Lygia Clark (artistas plásticos), de Ferreira Gullar (poeta e crítico de arte)”. Segundo Viviana, “era como se algumas das controvérsias inflamadas daqueles anos ressurgissem para assombrar público e especialistas, seja como impasses, seja como questões em aberto”. Ela cita a opinião de Ferreira Gullar, que inflamou a discussão, utilizando a instalação de Laura Vinci para exemplo da efemeridade degenerativa da arte contemporânea. Gullar, em entrevista, disse: “Não vou mais à bienal, não é mais vanguarda há anos, é a repetição da repetição da mesma coisa. Ninguém pode me dizer que cocô dentro de uma lata é arte. Li que numa instalação uma moça pôs várias maçãs numa mesa. Prefiro as maçãs de Cézanne, que duram mais. Ela vai fazer o quê após desfazer a mesa? Comer, guardar? Apodrece. Quero ver quando ela tiver 70 anos. Tudo o que fez se apagou. Só restarão fotos das obras. Será que não percebe que é uma furada, um oportunismo de momento”. Laura Vinci, em réplica, defendeu que as “considerações ácidas sobre a obra e o estado geral da arte”, feitas por Gullar, ignoraram o trabalho simbólico e semântico da obra, além de seu intuito, que era o de tecer “uma pergunta sobre o destino da arte, e não uma confusão da arte com o lixo”. Segundo Viviana Bosi: “Não se pode negar certa afinidade entre os questionamentos enfrentados pelas artes plásticas e pelos poetas marginais, ao partilharem a postura antitradicional, a realização da obra em grupo, de modo artesanal e perecível, a ida às ruas, e a desconfiança em relação à arte autônoma e transcendente. […] A arte certamente voltou aos museus e às galerias, assim como a poesia aos livros produzidos e distribuídos pelas editoras. Mas a ferida aberta nos anos 70 não pode ser ignorada pois sua cicatrização apresenta uma marca indelével sob a forma aparentemente apaziguada do objeto artístico, a partir de então ainda mais contraditório: aponta tanto para as maçãs quanto para o mármore, paradigmáticos seja da nossa consciência da temporalidade precária seja do momento da figuração formal, como uma resistência, breve que seja, do desejo de beleza”.
O crítico de arte Rodrigo Naves, no artigo “Mona Lisa no meio do redemoinho” analisa: “A partir da “ampulheta” — na verdade, uma obra sem título —, realizada para a mostra “arte/cidade” de 1997, a artista parece ter circunscrito um espaço que a colocou em contato com uma região extremamente complexa e produtiva, que impulsionou sua obra com uma potência admirável. Ocorria como se a partir daquela instalação a artista tomasse consciência de forças que estavam muito além dela, cabendo-lhe apenas elaborar os instrumentos que transformassem aquela energia dispersa em algo apto a ser experimentado pelos nossos sentidos — não só pela visão — , sem que, neste movimento, houvesse uma domesticação dos elementos que eram a própria razão de ser dos trabalhos. Passagens, mudanças de estado da matéria, metamorfoses dos mais diversos elementos e transições se tornaram a marca distintiva de seu trabalho. Mas o lugar em que Laura se situava não se assemelhava ao Aleph do conto de Jorge Luis Borges, “(…) o lugar em que estão, sem se confundirem, todos os lugares do mundo, vistos de todos os ângulos”. Ao contrário, tratava-se do ponto de cruzamento de forças expansivas e brutas, de energias fluidas e plásticas, anteriores às configurações e aos nomes”.
Autor: Laura Vinci; textos de Guilherme Wisnik, Lorenzo Mammì, Paulo Sérgio Duarte, Rodrigo Naves, Taísa Palhares
Editora: CosacNaify
Preço: R$ 65,80 (218 págs.)