Arquivo da tag: poesia contemporânea

matraca

Jogue fora os atalhos

12 agosto, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Nyjah Huston, por De’Von Stubblefield

O novo livro de poesia do gaúcho Paulo Scott, Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo, acaba de ser lançado pela Companhia das Letras.

Scott é considerado um dos mais originais poetas brasileiros atuais. Sua poesia é quase prosaica no que tem de fluência ao apresentar histórias e episódios – sobre amores perdidos ou recém chegados, sobre as derrocadas da vida, a violência nas relações humanas, a busca pelo sublime no cotidiano de um escritor brasileiro. A força narrativa de seus poemas permite que sejam lidos quase como se fossem pequenos contos.

Nas palavras de Paulo Henriques Britto: “Neste livro, Paulo Scott deixa bem claro ter plena consciência do que se exige de sua geração, surgida num momento em que, pela primeira vez, após bem mais de meio século, cada poeta tem de construir sua linguagem a partir de um legado diversificado e acachapante, sem as rotas de percurso alternativas que balizaram, para o bem e para o mal, aqueles que os antecederam”.

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matraca

bem compreenderás o sentido das Ítacas

14 maio, 2014 | Por Isabela Gaglianone

–  Que esperamos reunidos na ágora?

É que hoje os bárbaros chegam.

– Por que tanta abulia no Senado?

Por que assentam os Senadores? Por que não ditam normas?

Porque os bárbaros chegam hoje.

Que normas vão editar os Senadores?

Quando chegarem, os bárbaros ditarão as normas.

– Por que o Autocrátor levantou-se tão cedo

e está sentado frente à Porta Nobre da cidade

posto em seu trono, portanto insígnias e coroa?

Porque os bárbaros chegam hoje.

E o Autocrátor espera receber

o seu chefe. Mais do que isto, predispôs

para ele o dom de um pergaminho. Ali

fez inscrever profusos títulos e nomes sonoros.

(Konstantinos Kaváfis, “À espera dos bárbaros”, tradução de Haroldo de Campos)

O grego Konstantínos Kaváfis (Κωνσταντίνος Πέτρου Καβάφης), considerado o maior poeta da Grécia moderna, não teve nenhum livro publicado em vida, distribuía os poemas em folhas soltas, também publicou alguns em revistas literárias. Seus poemas, 154 reelaborados durante a vida inteira, une citações eruditas à fala cotidiana. Uma obra tão pequena quanto notável, referência definitiva para o modernismo na poesia.

No Brasil, a Cosac Naify publicou um belo livrinho que reúne 15 poemas de Konstantinos Kaváfis traduzidos por Haroldo de Campos. Continue lendo

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Crítica Literária

Rubens Rodrigues Torres Filho .parte I.

17 maio, 2013 | Por Isabela Gaglianone

poema semipronto*

Dante fez o que quis.
–  –  –  Beatriz.

__________
*) Adicionar água e levar a fogo brando.

A arqueologia da palavra é tarefa compartilhada pelo filósofo e pelo poeta. “As palavras são símbolos que postulam uma memória compartilhada”, segundo Borges. Trabalho minucioso, do espírito e da letra. E se acontece-lhe ser feito na poesia escrita por um filósofo, como o é Rubens Rodrigues Torres Filho, ganha um polimento ambivalente porém exato, um humor fino que permite-se chegar a vocábulos eruditos ou expressões coloquiais com a mesma facilidade – e com a mesma ironia.

Poeta solitário, alheio a escolas, grupos ou modismos, mesmo porque a poesia foi-lhe tarefa secundária – quase um capricho, segundo o poeta Cacaso (Antônio Carlos de Brito) – em relação à filosofia, seu objeto de estudo e interesse primeiro. Rubens foi professor de filosofia moderna na Universidade de São Paulo, especialista na filosofia de Fichte – a respeito da qual escreveu uma notória tese, O espírito e a letra: a crítica da imaginação pura em Fichte –, comentador da filosofia alemã, sobretudo dos períodos conhecidos como o Idealismo e o Romantismo, profícuo tradutor de obras de autores como Nietzsche, Novalis, Benjamin, Adorno, Schelling, Kant e Fichte. Nos trabalhos filosóficos vemos sua poesia – a sua articulação de uma brincadeira com a hermenêutica das palavras – em germe. Suas traduções já possuem o cuidado preciso com as palavras, equilibradas como numa escultura; seus comentários de filosofia, o humor irônico que lhe é peculiar.
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cinema

“Eu e Crocodilos”, de Marcela Arantes

15 janeiro, 2009 | Por admin

O Festival de Cinema Independente de Sundance (que, segundo um artigo no uol, celebra uma cinematografia, em tese, à margem da indústria), começa hoje e contém 2 produções nacionais entre os concorrentes. Sobre o longa Carmo, uma co-produção entre Brasil, Espanha e Polônia, você pode ler a respeito no Blog da Redação de Cinema do UOL.

Já o outro concorrente brasileiro, o curtametragem Eu e Crocodilos, poderá ser explorado com mais profundidade aqui neste Blog, pois o filme está disponível para ser assistido online: “Eu e Crocodilos“.

O filme foi inspirado na poesia contemporânea da inglesa Susan Wicks – desconhecida no Brasil, como de praxe -, baseado no poema “On Being Eaten By a Snake” – publicado no livro Open Diagnosis, de 1994 -, que pode ser lido abaixo:

On being eaten by a snake

Knowing they are not poisonous
I kneel on the path to watch it
between poppies, by a crown of nasturtiums,
the grey-stripe body almost half as long
as my own body, the formless black head
rearing, swaying, the wide black lips seeming
to smile at me. And I see
that the head is not a head,
the slit I have seen as mouth
is not a mouth, the frilled black under-lips
not lips, but another creature dying: I see
how the snake’s own head is narrow and delicate,
how it slides its mouth up and then back
with love, stretched to thin shapelessness
as if with love, the sun stroking
the slug’s wet skin as it hangs
in the light, resting, so that even the victim
must surely feel pleasure, the dark ripple
of neck that is no neck lovely
as the slug is sucked backwards
to the belly that is not belly, the head
that is merely head
shrinking to nameable proportions.

*fonte: The Guardian, 5 de março de 2000, “Books: The Sunday Poem – No. 59 Susan Wicks”

“Eu e Crocodilos”, com Giulia Amorim, Bia Barbosa, Patricia Soares, Victor Mendes, Ronny Kriwat e Theo Nogueira. Direção e Roteiro: Marcela Arantes © Kns Produções.

Susan Wicks

O site da Livraria Cultura possui apenas dois livros da autora disponíveis para compra, e ambos levam 6 semanas para chegarem ao consumidor. São eles, DE-ICED e NIGHT TOAD.

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