Arquivo da tag: Paul Valéry

Literatura

Entro em cena em meu olhar

4 janeiro, 2018 | Por Isabela Gaglianone

Janelas se iluminam. Dou um passo na sacada…

Entro em cena em meu olhar.

Minha presença se percebe como o igual e o oposto de todo este mundo luminoso que quer convencê-la de que ele a rodeia. Eis aqui todo o choque entre a terra e o céu. O instante quer me prender e o lugar acredita me cercar…

Mas o lugar com seu instante não é, para o espírito, senão um incidente – um acontecimento – um demônio como um outro… Todo esse dia, um demônio de minha noite pessoal. […] – Paul Valéry.

Esboço, Edgar Degas

Esboço, Edgar Degas

Diz o próprio Paul Valéry, sobre seu Alfabeto:

Foi-me pedido, há alguns anos, que escrevesse vinte e quatro fragmentos de prosa (ou de versos variados) cuja primeira palavra deveria, em cada um, começar por uma das letras do alfabeto. Alfabeto incompleto? Sim. É que se tratava de utilizar vinte e quatro letras ordenadas, em xilogravura, que se pretendia publicar com o auxílio de alguma literatura – pretexto e causa aparente do álbum pensado. Essas condições não me intimidam. O gravador havia omitido duas letras, as mais incômodas, aliás, as mais raras em francês: o K e o W. Restam XXIV caracteres. Veio-me a ideia de ajustar essas XXIV peças a serem escritas às XXIV horas do dia; a cada uma das quais se pode bastante facilmente fazer corresponder um estado e uma ocupação ou uma disposição da alma diferente; decisão bastante simples.

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Artes Plásticas

Um livro que dança

18 março, 2015 | Por Isabela Gaglianone

“[…] A vontade domina. Seu traço nunca está suficientemente perto do que ele quer. Não alcança nem a eloquência, nem a poesia da pintura; busca apenas a verdade no estilo e o estilo na verdade. Sua arte se compara à dos moralistas: uma prosa das mais límpidas que encerra ou articula com intensidade uma observação nova e verdadeira” – Paul Valéry, sobre Degas.

Degas dança desenho. Paul Valéry não enumerou com vírgulas as três palavras que dão título ao pequeno livro que dedicou ao caro amigo e pintor, Edgar Degas. Não o fez, para não distinguí-las em hierarquias categoriais sequenciadas em termos de relevância: o desenho dança em Degas, a dança desenha-se na maneira como ele vê as formas e as capta, ligeiramente fora de proporção, Degas dança o desenho; e no desenho Valéry encontra um conceito amplo, que abarca uma visão de época, uma visão de mundo e uma mediação entre o artista e essas duas visões. Mediação feita à maneira de uma tradução, de matriz hermenêutica: o desenho, livre enquanto dança, estruturador enquanto arte, é a própria arquitetura da imagem enquanto retórica da imaginação em relação à razão: através dele, a noção torna-se substância.

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