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Literatura

O tempo passa

22 dezembro, 2017 | Por Isabela Gaglianone

“Nesse calor, o vento enviou de novo seus espiões à casa. As moscas trançavam uma rede nos quartos ensolarados; as ervas daninhas que tinham crescido junto à vidraça, batiam metodicamente, à noite, na janela. Quando a escuridão caía, o clarão do farol, que nas noites escuras se estendia com autoridade sobre os tapetes, traçando seu desenho, vinha agora misturado ao luar, deslizando suave e furtivamente como se depositasse sua carícia e se demorasse e olhasse amorosamente outra vez.”

Turner, "Waves Breaking against the Wind"

Turner, “Waves Breaking against the Wind”

O tempo passa” é o título da segunda das três partes que compõem o romance Ao Farol, de Virginia Woolf. No início de 1927, ano da publicação do livro na Inglaterra, Virginia enviou uma versão dessa parte para ser publicada, em tradução, em uma revista francesa e o original em inglês permaneceu inédito até 1983, quando o pesquisador James M. Haule o descobriu. Esta versão – que difere significativamente da que foi incluída em Ao Farol e cuja autonomia parece ter sido reconhecida pela própria Virginia – foi publicada em edição bilíngue no Brasil em 2013, pela editora Autêntica, com tradução de Tomaz Tadeu.

Trata-se de um texto de beleza pungente. O fluxo de consciência perpassa a progressiva deterioração da casa de praia na qual a família Ramsay passava suas férias de verão. A poesia da narrativa ramifica metaforicamente a deterioração da casa em temporalidades diversas, desdobra-a em memórias idas, que a imagem constante do mar enfatiza, do mofo dos objetos esquecidos à afirmação de sua própria eternidade, onda após onda.

“A quietude e a beleza apertaram-se as mãos no quarto; entre os jarros com suas mortalhas e as cadeiras revestidas, nem mesmo a prece do vento, o delicado nariz dos úmidos ares marinhos, roçando, farejando, iterando e reiterando suas perguntas – ‘Irão vocês extinguir-se? Irão vocês perecer?’ – conseguem perturbar essa paz, esta indiferença, este ar de integridade, em que não há qualquer compromisso, em que a verdade estava descoberta, como se a pergunta que faziam não precisasse de nenhuma resposta: nós permanecemos”. Continue lendo

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lançamentos

Aquários recortados

3 março, 2015 | Por Isabela Gaglianone
Virginia Woolf e seu pai, sir Leslie Stephen.

Virginia Woolf e seu pai, sir Leslie Stephen.

Os ensaios de Virginia Woolf tem ultimamente recebido especial atenção editorial brasileira. O sol e o peixe, publicado agora pela editora Autêntica, reúne nove de suas prosas poéticas.

São ensaios sobre temas diversos: em um deles, Virginia contrapõe o fenômeno de um eclipse solar à observação de peixes em um aquário; um ensaio tece uma análise sobre o pai da autora; em outro, escreve sobre Montaigne; em um ensaio dedica-se a pensar sobre a paixão pela leitura; em outro, reflete sobre a então recente arte cinematográfica, explorando relações que ela estabelece entre literatura e pintura.  Continue lendo

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Literatura

Fragmentos

9 dezembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“Ninguém vê ninguém como é, exceto uma idosa senhora sentada diante de um rapaz estranho num vagão de trem. As pessoas veem um todo – veem todo tipo de coisas – veem a si próprias”.

Virginia Woolf e seus irmãos, Thoby, Adrian e Vanessa.

Publicado originalmente em 1922, O quarto de Jacob é o primeiro romance em que Virginia Woolf explora o estilo experimental que se tornou tão característico em sua obra. Foi também o primeiro de seus livros publicado pela editora do casal Woolf, a Hogarth Press e, por isso, marco de sua liberdade criativa editorial.

A narrativa orbita de forma plurivalente em torno da história de vida do protagonista Jacob Flanders, apresentada através de impressões, do próprio protagonista e de outros personagens em relação a ele. A narrativa é construída como espécie de fuga rapsódica de memórias e sensações; nela, a descrição concreta é substituída por impressões cuja espontaneidade e tempo de desenvolvimento formam uma prosa delicada e profundamente humana. Seu fio condutor são os tormentos, as dúvidas, as ambições, os pensamentos, os silêncios das personagens. O narrador, como também acontece nas obras posteriores de Virginia Woolf, não é onisciente, ele mesmo sugere, tem dúvidas, mostra-se um observador.

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Literatura

Narrativa profunda, poética densa

7 agosto, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“Sim, claro, se amanhã fizer bom tempo.”

Fotografia de Jean Guichard

Ao farol, de Virginia Woolf, é uma transcriação artística das experiências vividas pela escritora na casa de praia de sua família, na baía St. Ives, na Cornualha, Inglaterra, de onde ela podia avistar o farol da ilha de Godrevy. No romance, através das personagens Sr. e Sra. Ramsay, ela problematiza, desloca e formula sua relação com seu pai, Leslie Stephen, um “espartano, ascético, puritano”, e com sua amada e belíssima mãe, Julia Stephen que morreu quando Virginia Woolf tinha apenas treze anos – tragédia pessoal que desencadeou então o primeiro dos colapsos nervosos que atormentariam a escritora ao longo de toda sua vida. A própria Virginia ganha vida no livro como a pintora Lily Briscoe, que passa as férias de verão na Ilha de Skye, na Escócia, ao invés de St Ives. Sua memória, porém, é apenas a matéria bruta, que a autora esculpe para dar forma a este magnífico romance.

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Crítica Literária

Algo sério para ser cômico

11 julho, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Ótimo lançamento da CosacNaify, a coletânea O valor do riso e outros ensaios, de Virginia Woolf, chega às livrarias, cuidadosamente traduzido pelo crítico e poeta Leonardo Fróes, também responsável pela organização e pelas notas do livro. O volume reúne 28 ensaios, a maioria com tradução inédita no Brasil.

Os ensaios foram escritos entre 1905 e 1940 e originalmente publicados como artigos para jornais e revistas com os quais Virginia colaborava. É possível notar nestes textos a escrita precisa, mesmo talento da ficcionista que, aplicado ao gênero ensaístico, mostra um olhar mais mundano, de um observador atento, ou que, investido nas resenhas, revela uma crítica perspicaz e militante.  Continue lendo

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Literatura

A voz de Virginia Woolf

20 agosto, 2009 | Por admin

“Presume-se que este seja o único registro da voz de Virginia Woolf. Foi gravado em 29 de Abril de 1937 para a transmissão de uma série chamada “Words Fail Me”, da rádio BBC. Woolf tinha 55 anos na época.

Esta leitura foi posteriormente publicada no conjunto póstumo de ensaios The Death of the Moth and Other Essays (sem tradução para o português). Você pode ler a transcrição da gravação no blog Star Stuff (e se alguém está a procura – ou se interessa – por algo mais bizarro, aqui está uma versão animada onde Woolf parece estar falando)

O que me chama a atenção quando deparo-me com gravações como essa é a impossibilidade de não clicá-las e ouvi-las. Há algo de curioso quando se ouve Virginia Woolf lendo seus próprios escritos: as palavras que ela escolhe para enfatizar, as que ela não escolhe; o ponto onde ela faz uma pausa entre sentenças; o modo como ela diz as palavras “multitudinous seas”. Entretanto – e digo isso como um tributo à sua magnificência como escritora -, no final, tudo isso parece irrelevante. Talvez para um biógrafo isso adicione uma nova dimensão para a visão parcial que se tem do caráter de uma pessoa. Mas ao ler a transcrição, lembro-me de como me senti quando, pela primeira vez, tive que ler The Death of the Moth nas aulas de inglês do colegial: mesmo sem amplificação, a escrita de Woolf fala por si só.”

Este texto foi uma tradução livre do artigo Virginia Woolf: Words Fail Me, publicado no blog sobre livros da The New Yorker.

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Literatura

127º aniversário de nascimento de Virginia Woolf

28 janeiro, 2009 | Por admin

Esta semana marca as comemorações do 127º aniversário de nascimento de Virginia Woolf. A especialista na autora e autora do livro “Virginia Woolf: Feminismo e o Leitor”, Anne Fernald, deu uma entrevista ao Los Angeles Times, que traduzo abaixo, em 7 perguntas:

Jacket Copy: Eu nunca li Virginia Woolf. Por onde começo?

Anne Fernald: Há muitas maneiras de se começas Woolf. Se você está interessando em ficção experimental, então leia “As Ondas”, seu texto mais experimental – e talvez o mais difícil -, pode ser um bom ponto de saída. Ele acompanha 6 amigos da infância até a meia idade, todos em monologos interiores – você desliza, como ondas, dentro e fora dos pensamentos de Rhoda, Jinny, Susan, Neville, Louis (baseado em T. S. Eliot, de St. *Louis*! ha), e Bernard.

Mas se você prefere romances autobiográficos, então “Rumo Ao Farol” é um adorável ponto de partida. O romance mais autobiográfico de Woolf, descreve uma grande família Vitoriana em férias de verão e mapeia os impactos da Primeira Guerra Mundial e outros eventos da vida através dos anos. Ele possui o melhor personagem-artista de Woolf: Lily Briscoe, uma pintora frustrada.

Para uma completa perfeição de prosa, eu amo “Um Quarto Só Para Si”, sua obra-prima feminista de 1929. É um grande manifesto para todos os escritores: a necessidade tanto de privacidade e da capacidade de vagar tranquilamento no mundo. Mas eu amo ele por suas sentenças maravilhosas, suas gloriosas metáforas, o modo esplêndido como suas peças se encaixam todas juntas para formar uma sinfonia.

No geral, para mim, sua obra-prima é “Mrs. Dalloway”. Há muito pelo que não se gostar do personagem principal, a anfitriã dando uma festa (ronco), mas Woolf sabe disso e ensina-lhe a gostar dela apesar dos defeitos de Clarissa. É uma livro impressionante e um dos melhores tratamentos para shellshock que eu conheço.

As outras perguntas são (talvez eu traduza hoje a noite):

2. Quais autores você compararia com o trabalho de Woolf – James Joyce? William Burroughs? Alguém completamente diferente?

3. Qual você acha que é o lugar de Woolf na história da literatura?

4. O que a levou, a princípio, ao trabalho de Virginia Woolf?

5. Você acha que a atração a Woolf é dividida entre os sexos – as mulheres tendem a responder mais a seu trabalho que os homens?

6. Fordham vai dar uma grande conferência sobre Woolf este ano. Quais são os estudos mais interessantes sobre Woolf hoje em dia?

7. Você viu “As Horas”, com Nicole Kidman interpretando Virginia Woolf? O que achou?

matéria original: http://latimesblogs.latimes.com/jacketcopy/2009/01/virginia-woolf.html

Livros de Virgínia Woolf

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