Arquivo da tag: sociologia

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Lógicas de situação

8 abril, 2015 | Por Isabela Gaglianone

“As crises políticas e os fenômenos críticos contíguos que se observam nos sistemas sociais complexos tornam-se inteligíveis em seus traços essenciais desde que a pensemos em termos de dessetorização tendencial do espaço social desse sistema” – Michel Dobry.

Renina Katz

Renina Katz

O clássico estudo Sociologia das crises políticas, do sociólogo francês Michel Dobry, ganhou tradução para o português pelas mãos de Dalila Ribeiro, na edição lançada no final do ano passado pela Editora Unesp. Dobry propõe uma nova abordagem para o estudo das crises políticas, interpretando-as não como imprevistos ou patologias, mas como a norma das relações sociais. Na visão do autor, tais crises resultam das relações sociais e não devem ser compreendidas apenas como factuais. Embora o sociólogo não desconsidere os aspectos históricos e factuais, sua análise propõe que a reflexão sobre as crises políticas deve concentrar-se na idealização de métodos que formem um esquema teórico capaz de ultrapassar as particularidades e revelar as suas dinâmicas características gerais. Seu método abre a possibilidade de estudo dos aspectos constitucionais das crises, sem perder de vista as racionalidades de situações específicas que constrangem as percepções, os cálculos e as táticas dos atores.  Continue lendo

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Desumanização

2 abril, 2015 | Por Isabela Gaglianone
Matisse

Matisse

“A ‘realidade’ assedia constantemente o artista visando impedir a sua evasão. Que astúcia não supor a fuga genial! Terá de ser a de um Ulisses às avessas, que se liberta da sua Penélope quotidiana e navega, entre escolhos, rumo ao bruxedo de Circe. Quando consegue escapar por um momento à perpétua cilada, não levemos a mal ao artista um gesto de soberba, um breve gesto à maneira de São Jorge, com o dragão jugulado aos seus pés”. 

 

No ensaio A desumanização da arte o filósofo espanhol Ortega y Gasset traça uma análise crítica sobre a estética e a história da arte desde o período romântico até às vanguardas do século XX, buscando as razões para a impopularidade das novas artes.

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A produção é destrutiva

25 março, 2015 | Por Isabela Gaglianone

cartaz

O filósofo húngaro István Mészáros, interpreta, em O desafio e o fardo do tempo hitórico, o significado histórico da crise estrutural do capital, que, como “ordem estabelecida”, produz destruição – do tempo livre, da educação, das pessoas, da cultura, da natureza, da vida. Articulando argumentos de filosofia, economia política e teoria social, Mészáros mostra que capital atua somente na destruição e reafirma a necessidade do socialismo no século XXI.

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Sinto-me incapaz de pensar sem escrever

10 março, 2015 | Por Isabela Gaglianone
René Magritte. La clef des songes

René Magritte. La clef des songes

Para o olhar atento do sociólogo, antes de desdobrarem-se em eventos sociais, os acontecimentos cotidianos já revelam sinais do tempo. Zygmunt Bauman, em Isto não é um diário, parte de reflexões suscitadas por leituras de notícias de jornais, de lembranças, de análises tecidas ao longo do acompanhamento vivido do desenvolvimento da situação política e econômica mundial, observando acontecimentos rotineiros para pensar sobre os significados neles contidos e pontuar questões sobre o mundo contemporâneo: o significado da palavra democracia nos movimentos que levaram à Primavera Árabe, a impiedosa perseguição aos ciganos na França, a bolha imobiliária americana, o papel dos países emergentes na estratégia mundial de globalização, ou mesmo sua paixão então recém-descoberta pelo escritor José Saramago.

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Racionalidade instrumentalizada

21 janeiro, 2015 | Por Isabela Gaglianone

Técnica e ciência como “ideologia”, de Jürgen Habermas, é uma coletânea de cinco ensaios, publicada originalmente em 1968. O ensaio cujo título dá nome ao volume originou o livro que seria publicado treze anos mais tarde, Teoria da ação comunicativa, considerado o ponto nevrálgico de toda a produção filosófica de Habermas.

Em suas considerações iniciais à obra, o filósofo aponta os ensaios “Técnica e ciência como ideologia” e “Conhecimento e interesse” – transcrição de uma aula inaugural, por ele proferida na Universidade de Frankfurt – como diferentes dos demais da coletânea, por não serem meros “trabalhos de ocasião”.

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Literatura

Ficção filosófica

17 dezembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Gabriel Tarde (1843-1904)

Imbricada entre a Viagem ao centro da Terra de Júlio Verne e a Máquina do tempo de H. G. Wells, a ficção filosófica científica Fragmento de história futura, de Gabriel Tarde, propõe, a seu turno, uma visão dos séculos vindouros. A obra, publicada originalmente em 1896, é considerada uma fábula sociológica. Seu narrador vive num futuro distante, por volta do século XXXI, e conta a história de um mundo que não precisa de luz, nem de felicidade: mundo em que, extinto o sol por uma catástrofe, a humanidade decide habitar as entranhas da terra, distante de qualquer vestígio de natureza. Nossos supostos descendentes ‘trogloditas’ – não no sentido de neoprimitivos, mas como representantes de uma artificialização emancipatória da humanidade, responsável pelo florescimento de uma civilização refinada – deram início a uma utopia subterrânea, o nascimento de uma humanidade que pode tirar tudo de si mesma, para a qual a natureza ganha “o encanto profundo e íntimo de uma velha lenda, mas de uma lenda na qual acreditamos”.

O cenário atordoante que a imagem cria, serve para Tarde como desenvolvimento de um experimento ficcional para suas teorias sociológicas. Trata-se de um experimento intelectual para pensar a essência da sociedade humana, através da descrição de uma “humanidade inteiramente humana” resultante da “eliminação completa da Natureza viva, seja animal, seja vegetal, excetuado apenas o homem. Daí, por assim dizer, uma purificação da sociedade”.

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lançamentos

O problema está em saber quem é que manda.

21 novembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

fotografia de Martin Parr

Gilberto Dupas identificou O mito do progresso: constantemente renovado por um aparato ideológico capaz de fundamentar a ideia de que a história teria um destino certo e glorioso; o cientista social, neste ensaio, analisa a quem o progresso serve e quais são seus riscos e custos de ordem social, ambiental e em termos de sobrevivência da espécie. Dupas busca, assim, levantar elementos que desconstruam o discurso hegemônico sobre a globalização associada à ideia de progresso necessário. Seu texto aponta os problemas deste progresso, mostra-o como discurso dominante das elites globais, que traz consigo exclusão, concentração de renda, subdesenvolvimento, danos ambientais, restrição dos direitos humanos essenciais, riscos decorrentes da microbiologia e da genética, bem como graves dilemas éticos e morais. O tão falado “progresso” é um mito. Uma construção ideológica, que valida interesses econômicos e políticos restritos.

Lançado originalmente em 2006, o livro acaba de ser republicado pela Editora Unesp.

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A imagem da imagem

12 novembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

fotografia do espanhol Chema Madoz

Simulacros e simulação, do filósofo francês Jean Baudrillard é um tratado irônico sobre os símbolos que permeiam a compreensão contemporânea de realidade.

Ele parte da identificação do conceito do simulacro enquanto gerador de modelos de um real, cuja origem, porém, não encontra-se na realidade. As simulações e os simulacros não são apenas abstrações fictícias, mas representações da realidade, feitas a partir de vestígios imaginários desta mesma realidade, que criam um hiper-real. Partindo de uma reflexão sobre os sentidos da imagem, da fotografia à publicidade, Baudrillard chega à crítica da sociedade de consumo, constatando a perda da relação do sujeito com o objeto. O real, segundo ele, desapareceu, desintegrando todas as contradições à força de produção de signos equivalentes.

Baudrillard ao longo do livro desenvolve a noção de hiper-realidade, que, povoada por simulacros, toma o lugar da realidade. Trata-se de um diagnóstico de época, da demonstração de que, no mundo moderno e contemporâneo, as imagens tornaram-se paulatinamente tão repletas de conteúdo, que passaram de símbolos a coisas reais. Continue lendo

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Forma-de-vida

15 outubro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“Nós jamais chegaremos a perceber o que se passa hoje em dia sem compreender o fato de que o capitalismo é na verdade uma religião” – G. Agamben.

São Francisco de Assis, por Giotto.

Altíssima pobreza, de Giorgio Agamben, dá prosseguimento e às reflexões e análises iniciadas em obras anteriores e debruça-se sobre o universo sacerdotal, reconstruindo a genealogia de uma forma-de-vida, “uma vida que se vincule tão estreitamente a sua forma a ponto de ser inseparável dela”. Sua argumentação funda-se na ampla análise do legado mais precioso do franciscanismo – ao qual a história ocidental inúmeras vezes voltou-se como sua tarefa indeferível –, a concepção de vida que não se encaixa em vínculos de propriedade, que não é sujeita à posse, somente ao uso comum. Agamben parte de uma leitura profunda do monasticismo ocidental, de Pachomius a São Francisco, reconstruindo em detalhe a vida dos monges. O filósofo defende a tese de que a verdadeira novidade do monasticismo não encontra-se na indistinção entre vida e norma, mas na descoberta desta concepção, em que “vida”, talvez pela primeira vez, foi afirmada em sua autonomia; convepção a partir da qual a alegação da “altíssima pobreza” e do “uso” desafiam e emancipam-se da lei.

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fotografia

Entre o mundo e a câmera

1 outubro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“La importancia de la fotografía no sólo reside en el hecho de que es una creación, sino sobre todo en el hecho de que es uno de los medios más eficaces de moldear nuestras ideas y de influir en nuestro comportamiento”. 

Gisèle Freund, auto-retrato.

La fotografía como documento social, da fotógrafa e estudiosa da fotografia Gisèle Freund, é um trabalho profundo que, publicado originalmente em 1974 – sob o título Photographie et Societé –, foi base para o desenvolvimento da reflexão sobre fotografia como conceito.

Freund pensa a fotografia à luz de sua história sociológica, política e artística. Mais do que simples técnica, a fotografia é aqui interpretada como elemento singular de conhecimento, localizada no entroncamento entre informação e arte.  Continue lendo

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Ensaio sobre o medo e os fins

17 setembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

A pergunta do título é desconcertante: Há mundo por vir?. O livro de Déborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro, lançamento co-editado pela editora Cultura e Barbárie e pelo Instituto Socioambiental (ISA), propõe uma reflexão séria a respeito dos atuais discursos sobre “o fim do mundo”.

Lasar Segall

Atualmente, os materiais e análises sobre as causas (antrópicas) e as consequências (catastróficas) da “crise” planetária vêm se acumulando com extrema rapidez, mobilizando tanto a percepção popular quanto a reflexão acadêmica. Os discursos que traçam prognósticos fatalistas são pelos dois autores tomados como experiências de pensamento, como tentativas de invenção, não necessariamente deliberadas, de uma mitologia adequada ao presente.

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Lucratividade insone

15 setembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Edvard Munch

24/7 – Capitalismo tardio e o fim do sono, de Jonathan Crary, chega ao Brasil publicado pela CosacNaify, com tradução de Joaquim Toledo Jr.

De uma ironia cáustica e bem humorada, o livro expõe a complexidade da lógica mercantil para a qual a própria necessidade de repouso humana é um empecilho. Seu diagnóstico agudo identifica um mundo cujo funcionamento e cuja própria lógica não se prendem mais a limites de tempo e espaço. Crary mostra que hoje são financiadas pesquisas científicas que buscam desenvolver uma fórmula para criar o “homem sem sono”, capaz de trabalhar e consumir “24/7”: 24 horas, durante os sete dias da semana. O livro, por outro lado, resgata uma tradição da cultura ocidental que percebe no sono e no sonho possibilidades utópicas.  Continue lendo

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Complexas relações: democracia e totalitarismo

9 setembro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

“O ódio à democracia é tão velho quanto a democracia: a própria palavra é a expressão de um ódio”.

A Boitempo acaba de lançar O ódio à democracia, do filósofo francês Jacques Rancière, ensaio sucinto e provocativo, que com irreverência e erudição, evoca momentos da história da filosofia política para analisar alguns dos principais impasses nos quais se encontra hoje a democracia e a esquerda. Rancière aponta uma mutação ideológica, a democracia não mais opõe-se, virtuosa, ao horror totalitário, ela é, atualmente, exportada pelos governos pela força das armas, ao passo que reina silencioso um “individualismo democrático”, que sob  as injúrias do “igualitarismo”, esvazia os valores coletivos e forja um novo totalitarismo.

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Formas esquivas do mal

15 agosto, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Cegueira Moral reúne cinco diálogos de Zygmunt Bauman com Leonidas Donskis, filósofo e professor de ciência política na Universidade de Vytautas Magnus, na Lituânia.

O livro, que tem como subtítulo “A perda da sensibilidade na modernidade líquida”, constitui-se como materialização de um debate a respeito da insensibilidade diante do sofrimento do outro, fenômeno concomitante ao desejo de controle sobre a privacidade alheia.

Os filósofos abordam o problema do mal não restringir-se às guerras ou circunstâncias extremas como nas quais as pessoas agem forçadas por condições de coerção. O mal atualmente, mostra-se na passividade com que se assiste ao sofrimento alheio. Uma miopia ética, cegueira moral, que disfarça-se sob o signo da banalidade cotidiana.  Continue lendo

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Teoria social crítica

13 junho, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Luta por reconhecimento – A gramática moral dos conflitos sociais, de Axel Honneth, desenvolve uma teoria social normativa baseada na ideia de que o florescimento humano e a plena realização pessoal dependem da existência de relações éticas bem estabelecidas. Honneth, filósofo e sociólogo alemão, é diretor do célebre Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt e, herdeiro da Teoria Crítica fundada por Horkheimer e Adorno, seguiu a proposta de Habermas ao sugerir uma teoria como solução aos impasses de seus antecessores; é considerado, atualmente, o representante da terceira geração da “Escola de Frankfurt”.

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