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Natureza inquietante

14 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone

retrato de Ivan Búnin, por Leonard Turzhansky

A editora 34 acaba de lançar O amor de Mítia, do russo Ivan Búnin (1870-1953), sob a primorosa tradução de Boris Schnaiderman, que beira os cem anos de idade.

Búnin, em 1933, foi o primeiro escritor russo a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura. Sua obra, por uma lado, é grande herdeira da prosa realista russa do século XIX, sobretudo a de Tolstói. Porém, sua sua ficção conhece de perto as fraturas abertas pela modernidade.

Segundo Boris Schnaiderman, este é um dos textos mais vigorosos por ele já traduzidos.

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Guia de Leitura

Bibliofilia

12 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone

“Se lemos um livro antigo é como se lêssemos durante todo o tempo que transcorreu entre o dia em que foi escrito e nós. Por isso convém manter o culto ao livro. O livro pode conter muitos erros, podemos não concordar com as opiniões expendidas pelo autor, mas ainda assim, ele conserva algo sagrado, algo divino, não com um tipo de respeito supersticioso, mas com o desejo de encontrar felicidade, de encontrar sabedoria”

– Borges, “O livro” [in: Cinco visões pessoais. Brasília, Editora da UNB, 1985].

 

Os livros que lemos e os que escolhemos manter próximos a nós tornam-se capítulos de nossa história pessoal. O colecionamento de livros é tão especial justamente por ser motivado em parte como busca de certezas, em meio à velocidade um tanto efêmera do mundo.

O escritor Miguel Sanches, comentando o belo ensaio “Desempacotando minha biblioteca”, de Walter Benjamin, diz: “Se a literatura é o território movediço, a coleção de livros devolve-nos à exatidão das coisas. Não sem alguma ironia, Benjamin cita Anotole France: ‘O único conhecimento exato que existe é o ano de publicação e o formato dos livros’. Entre a desordem e a ordem possível, entre o caos e o cosmos, o colecionador vai transformando, segundo Benjamin, sua coleção em uma ‘enciclopédia mágica’, em que se manifesta um encontro inevitável: ‘o destino mais importante de cada exemplar é o encontro com ele, o colecionador, com a própria coleção’”. Trata-se de uma experiência mágica.

É, pois, semelhante a uma concha, a construção enquanto morada de filas e pilhas de livros, no sentido em que dá, à concha, Paul Valéry: “Uma concha emana de um molusco. Emanar parece-me a único termo próximo da realidade visto significar propriamente: deixar pender. Uma gruta emana suas estalactites; um molusco emana sua concha” [“O homem e a concha”].

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Frágil experiência do indivíduo

10 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone

“É diferente ser sem pátria em seu próprio país e sê-lo no estrangeiro, onde justamente essa falta de pátria pode nos levar a encontrar um novo lar”.

Fotografia de Roger-Viollet, da entrada de Auschwitz [janeiro de 1945]

A língua exilada, do húngaro Imre Kertész (1929), reúne ensaios, discursos e conferências, inclusive o texto proferido pelo autor quando do recebimento do Prêmio Nobel de Literatura, em 2002. A Academia Sueca, ao anunciá-lo vencedor, definiu sua escrita como sustentáculo da “vivência frágil do indivíduo contra a arbitrariedade bárbara da história”.

Entre as narrativas marcantes da segunda metade do século XX figuram seus relatos e reflexões, enquanto sobrevivente dos campos de extermínio nazistas. Imre Kertész transforma a experiência da deportação em reflexão sobre os valores éticos e morais da nossa sociedade.

A língua exilada é uma coleção de ensaios permeados pela idéia de que o Holocausto não é um acontecimento restrito aos nazistas e aos judeus: é uma experiência universal. Se Theodor Adorno disse ser impossível escrever versos após Auschwitz, Kertész afirma que o campo de concentração é um marco zero e que, portanto, nada mais poderia ser escrito sem fazer menção a ele. Segundo o autor húngaro, em todas as produções artísticas pós-Segunda Guerra Mundial estão evidentes as marcas da aniquilação dos valores que sustentavam a civilização antes do Holocausto. Passada a euforia inicial da queda do Muro de Berlim, em 1989, renasceram os velhos nacionalismos e, com eles, a sombra do anti-semitismo. Continue lendo

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Literatura

O baile de Lygia

7 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone

“Era o círculo eterno sem começo nem fim. […] A perplexidade do moço diante de certas considerações tão ingênuas, a mesma perplexidade que um dia senti. Depois, com o passar do tempo, a metamorfose na maquinazinha social azeitada pelo hábito: hábito de rir sem vontade, de chorar sem vontade, de falar sem vontade, de fazer amor sem vontade… O homem adaptável, ideal. Quanto mais for se apoltronando, mais há de convir aos outros, tão cômodo, tão portátil”

– trecho de “Eu era mudo e só” [Telles, Antes do baile verde]

 

Renina Katz

Reunião de narrativas escritas entre 1949 e 1969, publicada em originalmente em 1970, Antes do baile verde, de Lygia Fagundes Telles, é uma das obras mais marcantes da carreira da autora, pontuada por uma sensibilidade singular.

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Guia de Leitura

Os castelos encantados de Eco

5 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone

O escritor e filósofo italiano Umberto Eco [1932 – 2016] deixou um legado intelectual profícuo e amplo. Foi um dos intelectuais que ajudaram a refazer a figura do intelectual.

Como diz Pepe Escobar, em artigo Umberto Eco era o professor que sabia tudo: “Em 1971, Eco já ensinava ciências semióticas na faculdade de Letras e Filosofia de Bologna. Viu essa ciência experimental – lançada por Roland Barthes – como mais que um método; ela levou-o a experimentar além de todas as intersecções, entre culturas erudita e pop. Bebendo freneticamente da cultura pop, Il Professore teria de acabar na TV, que se pôs a dissecar com milhão de bisturis; disso veio um coquetel tóxico de kitsch, futebol, cultura das celebridades, publicidade, moda – e terrorismo. O embrião desse frenesi crítico já estava ativado em Apocalípticos e Integrados. A atitude apocalíptica da mídia-empresa reflete uma visão elitista e nostálgica de cultura; a atitude integrada privilegia o livre acesso aos produtos culturais, sem se preocupar com o modo como são produzidos. E foi o que levou Eco a propôr uma visão crítica de todos os meios da mídia-empresa, a qual, infelizmente, poucos tiveram coragem de aplicar”.

 

Umberto Eco, “Apocalípticos e integrados”

Um dos livros seminais de Umberto Eco, Apocalípticos e integrados é um verdadeiro marco na interpretação do fenômeno em tela O livro tornou-se referência fundamental na discussão sobre as definições dos dilemas da cultura de massa na era tecnológica.

O título já coloca as duas posturas intelectuais conceitualizadas por Eco e que marcaram as discussões sobre a indústria cultural e a cultura de massa no início da década de 70. Os apocalípticos e os integrados postulam os extremos entre as análises vigentes na referida discussão. Os primeiros, são caracterizados por encarar a cultura de massa como a anticultura,  como sintoma de sua decadência da cultura tomada em seu sentido aristocrático, consideram que a massificação provoca a perda da essência da criação artística, de sua “aura”, como dizia Walter Benjamim. Os segundos, compreendem a cultura de massa como um fenômeno do alargamento da área cultural, uma vez que faz com que uma arte e cultura popular possam ser consumidas por quaisquer camadas sociais; uma democratização cultural.

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Literatura

A estrada

3 março, 2016 | Por Isabela Gaglianone
foto_grossman

fotografia de vilarejo russo destruído.

Coletânea de prosa curta do grande escritor russo contemporâneo Vassili Grossman, A estrada traz textos de diversos gêneros, traduzidos diretamente do russo por Irineu Franco Perpétuo. O livro foi publicado no final do ano passado, pela Alfaguara, que também já havia publicado o notável Vida e destino.

Conhecido como o autor responsável por alguns dos mais impactantes relatos sobre a participação soviética na Segunda Guerra Mundial e sobre o Holocausto, Grossman, através desta reunião de reportagens intensas, contos esclarescedores e cartas comoventes, mostra mais um pouco do motivo pelo qual sua obra, reprimida na época stalinista, tem hoje tamanha ressonância internacional. Os textos aqui reunidos são devastadores, brutais e completamente atuais. Uma coletânea de escritos precedidos por introduções que, além de apresentar o contexto em que foram produzidos, trazem informações sobre a vida do autor e o recorrente eco da expressão “vida e destino” que, mais tarde, daria nome à sua obra-prima. Continue lendo

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Fantasmas antropológicos e literários

29 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

fotografia de Michel Leiris.

A África fantasma, do antropólogo, poeta e escritor Michel Leiris (1901-1990), foi publicado originalmente em 1934. Trata-se de um extraordinário diário, no qual Leiris registrou o cotidiano da Missão Etnográfica e Linguística Dacar-Djibuti. A missão ocorreu entre 1931 e 1933 e atravessou a África, de sua costa atlântica até o Mar Vermelho; foi a primeira iniciativa francesa de investigação etnográfica no continente africano.

Pode-se dizer que o livro sintetiza a marcante pluralidade de interesses do autor. Sua leitura, pessoal, dos acontecimentos ao longo do trajeto e da pesquisa, interpenetra, ao estudo antropológico, a escrita autobiográfica – experiência levada ao limite, no final da década de 1930, com Espelho Da Tauromaquia [Cosacanaify, 2002, esgotado]. O texto, dessa maneira, não é um caderno de campo antropológico strito sensu, tampouco mero relato de viagem; reúne em si ambos gêneros, alinhando-os, ainda, a esboços de ficção, comentários políticos, registro de sonhos, obssessões confessionais. Leiris definiu-o como um “simples diário íntimo”. Seu texto, porém, denso, é inclassificável. Segundo o tradutor,  André Pinto Pacheco, “a prosa de Leiris mistura o literário e o coloquial, o impessoal e o íntimo”. Continue lendo

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Guia de Leitura

Corpo na América e alma na África

27 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

A relação entre raças e classes no Brasil é complexa; relação que reflete o paralelismo histórico entre passado e presente, e a compreensão de que são acepções categoricamente iguais do sistema econômico.

A escravidão, após ter sido proibida em nosso país, não foi, porém, punida. Houve, após 1831, um pacto implícito, cúmplice da continuidade, a partir de então, ilegal, do comércio atlântico de africanos. Segundo o historiador brasileiro Luiz Felipe de Alencastro, como diz em artigo, assim; “Firmava-se duradouramente o princípio da impunidade e do casuísmo da lei que marca nossa história e permanece como um desafio constante aos tribunais e a esta Suprema Corte. Conseqüentemente, não são só os negros brasileiros que pagam o preço da herança escravista.

O comércio humano do tráfico negreiro justifica por um lado o início da história da pobreza no Brasil. Por outro, a eterna condição estrangeira dos descendentes de escravos, cuja consequência é a pouca integração econômico social, crônica, insolúvel, a despeito de sua maioria numérica no país.

Para Alencastro, as raízes do Brasil não devem ser buscadas em nosso próprio território, mas numa zona econômica formada entre o solo brasileiro e o africano – zona híbrida, luso-brasileira, luso-africana: trajeto do tráfico negreiro. De acordo com o historiador, pode-se “com muita razão dizer que o Brasil tem o corpo na América e a alma na África”.

Propomos um encontro desta afirmação com a análise de Florestan Fernades: “a Abolição constitui um episódio decisivo de uma revolução social feita pelo branco e para o branco”; afirmação que assim explica: “Primeiro, porque o ex-agente de trabalho escravo não recebeu nenhuma indenização, garantia ou assistência; segundo, porque se viu, repentinamente, em competição com o branco em ocupações que eram degra­dadas e repelidas anteriormente, sem ter meios para enfrentar e repelir essa forma mais sutil de despojamento social”.

Afinal, qual a dimensão do legado da escravidão para a formação social brasileira?

 

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A biografia velada de Cabrera Infante

25 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone
1965

1965

Corpos Divinos, do cubano Guillermo Cabrera Infante, acaba de ganhar uma edição brasileira. Trata-se de suas memórias, romanceadas; ou, nas palavras do autor, de uma “biografia velada”. A singularidade do olhar autobiográfico reconstitui de maneira vívida os dois anos narrados, do início de 1957 aos primeiros meses de 1959, decisivos tanto na vida de Cabrera Infante, como na história de seu país. O livro, inacabado, foi objeto de trabalho do autor por toda a sua vida.

Entre o período narrado, a vida do autor passa por diversas reviravoltas, ao mesmo tempo em que Cuba experimenta sua mais profunda revolução. Com uma elegância na escrita que o tornou admirado mundo afora, Cabrera Infante passeia por entre a história e a autonarrativa, ao mesmo tempo em que por entre a dicção refinada e o registro popular, através de saborosos jogos de palavras, de referências literárias, musicais e cinematográficas, de um singular humor irônico e, sobretudo, de um onipresente erotismo.

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Cosmopolítica do sonho

22 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone
Rosie Tasman Napurrurla, Warlpiri 2002, Ngurlu Jukurrpa (‘Semente de grama; grão de arbusto em sonho"’). Warnayaka Art Centre, Lajamanu, and Aboriginal Art Prints Network, Sydney

Rosie Tasman Napurrurla, Warlpiri 2002, Ngurlu Jukurrpa (“Semente de grama; grão de arbusto em sonho”). Warnayaka Art Centre, Lajamanu, and Aboriginal Art Prints Network, Sydney

O interessante pensamento antropológico de Barbara Glowczewski pôde ser conhecido pelo leitor brasileiro no ano passado, com Devires totêmicos— Cosmopolítica do Sonho. O livro percorre sua trajetória intelectual e reúne onze textos de sua autoria, dentre os quais inclusive as profícuas e estimulantes discussões que travou com o psicanalista Félix Guattari, em seus seminários[i] no início da década de 1980.

Parte do livro perpassa as instigantes análises baseadas na observação do povo Warlpiri do deserto central australiano – objeto de estudo da antropóloga há mais de trinta anos – e a sua cartografia totêmica que, baseada nos sonhos, constitui seus territórios existenciais nômades através de desenhos corporais ou danças rituais. Em um dos ensaios, sugere relações entre suas análises e narrativas com as linhas de errância de Deligny. Há ainda textos que dialogam com conceitos abrangentes da antropologia e da filosofia, como o perspectivismo de Viveiros de Castro e a ecosofia de Guattari, abrindo seu leque de discussão para questões cosmopolíticas extremamente atuais.  Continue lendo

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Guia de Leitura

Crítica ecológico-política

19 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

O lançamento do livro de Leonardo Boff, A Terra na palma da mão – uma nova visão do planeta e da humanidade, nos fez pensar a respeito da imbricação necessária, mas sobnegada, da crítica ambientalista em relação à crítica política. Pois Boff, frente às graves crises, sobretudo social e ecológica, e respondendo às reflexões do Papa Francisco sobre “o cuidado da Casa Comum”, para o qual exige-se “uma conversão ecológica global” e mudanças profundas “nos modelos de produção e de consumo, nas estruturas consolidadas de poder”, analisa a gravidade da atual situação e pergunta-se: para onde está caminhando o planeta Terra e a humanidade?

A ecologia e a política não são dissociadas uma da outra. E sua relação perpassa o “mito do progresso”, do qual é preciso ressaltar as implicações éticas e políticas, que são encobertas por sua dimensão ilusória  o ocultamento da pobreza, a dissimulação do comércio da saúde, a grave crise ambiental que o mito do avanço histórico oculta. O discurso do progresso é apropriado por interesses sectários das elites para a legitimação de seu acúmulo irrestrito de riquezas e a previsão lógica de sua perpetuação, simplesmente catastrófica.

 

Isabelle Stengers, "No tempo das catástrofes"

Isabelle Stengers, “No tempo das catástrofes”

Isabelle Stengers, em No tempo das catástrofes, realiza uma interessante intervenção no debate atual sobre a relação entre homem e natureza. A autora sugere o rompimento do conceito de infinidade de recursos no planeta. Ela também indica a necessidade de que, diante das atuais mudanças e desastres climáticos, haja uma mudança, também, na postura da impotência humana e na negligência governamental. Sob esse viés, ressalta o papel do indivíduo e a importância do resgate da relação de cada homem com a terra, encarando-a como um ser vivente.

Em entrevista concedida à revista “ClimaCom – Cultura Científica”, Isabelle Stengers conta como surgiu a atual nova história que vivenciamos e que seu livro anuncia: “Tive a convicção de que algo importante estava se passando em 1995, quando uma sondagem anunciou que uma maioria de franceses achava que suas crianças não viveriam melhor do que eles viveram. Não confiavam mais no ‘progresso’. Depois, tivemos as repetidas crises financeiras… No tempo das catástrofes foi escrito antes dessas crises. Na época, as revoltas da fome ligadas à especulação financeira e a história do furacão Katrina já eram excelentes exemplos daquilo que poderia muito bem estar nos esperando no futuro. A explosão das desigualdades sociais, a desordem climática, a poluição… fariam sempre mais estragos, mas o rumo do crescimento e da competividade seria mantido. Escrevi esse livro para resistir ao desespero, e para aqueles e aquelas que tentam escrever uma outra história, apesar das dificuldades: foi dito que hoje em dia é mais fácil enxergar o fim do mundo e da civilização que o do capitalismo. Mas os que estão buscando, todos eles sabem que a impotência que ressentimos faz parte do problema”. Diz ela que não há razão para ser otimista; o Estado e o capitalismo são os responsáveis pela destruição do ser humano e de seus meios de sobrevivência e o único meio de reverter o quadro alarmante é a autogestão planetária. Segundo a autora: “há dez anos venho constatando que existem lutas de um estilo novo. O combate contra os organismos geneticamente modificados (OGM), por exemplo, recriou um pensamento político a respeito do tipo de agricultura e de mundo que estamos construindo. Ele soube reaproximar camponeses, para quem os OGM são uma nova expropriação; anticapitalistas em luta contra a empresa das patentes; cientistas alarmados com as consequências. Todos eles aprenderam uns com os outros, e é por isso que o movimento conseguiu causar embaraço àquilo que se propunha como um progresso incontestável. Depois, a insubmissão se enriquece, ampara-se de novas questões”.  Continue lendo

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A menina-flor

17 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

“Durante o dia mantinham-na o tempo todo a céu aberto, expondo-a o quanto possível diretamente ao sol. O lado vegetal de sua pessoa afastava qualquer perigo de insolação”.

Odilon Redon

Odilon Redon

Bertha, a menina-flor é uma das partes suprimidas do romance Locus Solus, do vanguardista Raymond Roussel (1877 – 1933).

A cuidadosa publicação, feliz ganho para o leitor brasileiro, veio a lume através do selo Armazém – comandado por Juliana Crispe e Marina Moros –, da editora Cultura e Barbárie. A ótima editora, sediada em Santa Catarina, publicou, em edições caprichosas, alguns livros de Roussel, entre eles o supracitado Locus Solus, Como escrevi alguns dos meus livros [edição bilíngue] e Piparote.

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A viagem como vocação

15 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone
fotografia de W.B. Seabrook, analisada por Michel Leiris em Documents, n. 8, 1930, p.461

fotografia de W.B. Seabrook, analisada por Michel Leiris em Documents, n. 8, 1930, p.461

Fernanda Arêas Peixoto, em A viagem como vocação – Itinerários, Parcerias e Formas de Conhecimento, propõe um tema que aproxima diferentes autores – Leiris, Gilberto Freyre, Roger Bastide, Oliveira Lima e Pierre Verger: as viagens, realizadas entre as décadas de 1930 e 1960 pelo Brasil, pela América Hispânica e pela África.

A análise é guiada pela revisão dos textos dos autores à luz das viagens que realizaram em contextos muito precisos. Mais do que teorizar sobre as viagens, o livro mostra o grande interesse despertado pelas produções que as viagens geram, entre correspondências, diários, fotografias etc, que são valiosos instrumentos para a recuperação de processos de confecção de conhecimento. Fernanda Peixoto mostra um verdadeiro “ateliê” do criador, que passa a ser entrevisto através das análises, um espaço de experimentações, que tende a ser excluído quando da apresentação pública das obras.

Para a autora, a viagem é forma de acesso à produção das ideias e do conhecimento, ela própria aparece como uma forma de estar – e ser – no mundo, definindo um espaço próprio, provisório, como o são os percursos e as ideias.

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Guia de Leitura

Literatura de cordel

12 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

A literatura de cordel é uma das mais ricas e genuínas formas de literatura popular mantidas no Brasil. Espontaneidade e rigidez na métrica pontuam as narrativas com a melodia poética das rimas, característica inconfundível. Contam seus cantos e contos que, oriunda de Portugal, chegou com a colonização à Bahia e, dali, irradiou-se para os demais estados do nordeste brasileiro e recebeu o nome de poesia popular.

 

 

J. Borges, "Cordel"

J. Borges, “Cordel”

A editora Hedra tem uma coleção de 22 volumes de livros de cordéis, representando alguns dos mais conhecidos cordelistas brasileiros. Entre os livros, alguns exemplos são: Zé Vicente – nome pelo qual era conhecido o cordelista paraense Lindolfo Marques de Mesquita –, Téo Azevedo – cantador, repentista e violeiro, foi autor de quinhentas histórias da literatura de cordel, mais de mil e quinhentas músicas gravadas por vários intérpretes, foi, durante quarenta anos, produtor musical e produziu mais de três mil trabalhos, lançou quinze cds como cantador e, por fim, ainda foi autor de catorze livros sobre cultura popular brasileira –, Neco Martins – primeira antologia representativa do cordelista citado por folcloristas do final do século XIX e a quem Câmara Cascudo, em 1939, referiu-se, em Vaqueiros e Cantadores –, Francisco das Chagas Batista, Cuíca de Santo Amaro.

J. Borges é um dos cordelistas mais (re)conhecidos no Brasil. Nasceu no município de Bezerros, em Pernambuco, em 1935. Em 1964, passou a dedicar-se exclusivamente a sua atividade artística de xilogravador e poeta popular. Participou de exposições na França, Alemanha, Suíça, Itália, Venezuela e Cuba. Recebeu, dentre diversos outros, o Prêmio Cultura promovido pela Unesco e a Medalha de Honra ao Mérito outorgada pelo Ministério da Cultura, ambos em 2000, pelo conjunto de sua obra. É um dos principais artistas populares atualmente em atividade no Brasil. Continua trabalhando ao lado dos filhos, em seu ateliê em Bezerros.

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Folclore brasileiro

11 fevereiro, 2016 | Por Isabela Gaglianone

“aos cantadores e violeiros, analfabetos e geniais; às velhas cantadeiras de estórias maravilhosas, fontes perpétuas de literatura oral do Brasil, ofereço e consagro este livro que jamais hão de ler.”

gravura de Gilvan Samico

gravura de Gilvan Samico

Os dois volumes da Antologia do Folclore Brasileiro, de Luís da Câmara Cascudo, são uma referência única a aspectos do folclore e da etnografia brasileira.

Publicado originalmente em 1943, estimula, no leitor brasileiro atual, indagações sobre o paradeiro de tantas tradições da cultura popular. Há alguma nostalgia em relação a aspectos histórico culturais que a discrepância secular torna perceptíveis de uma maneira por demais abstrata, indiferenciando-nos em relação a tantos aspectos de nossos personagens formadores de cultura, a nosso passado, à nossa história? O que há em nós, enquanto povo, do chamado povo brasileiro de outros séculos? O que de nosso folclore já não é senão poético?  Continue lendo

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