Arquivo do autor:Isabela Gaglianone

Literatura

Tradução é criação

20 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Haroldo de Campos, foto: Eder Chiodetto

O livro Transcriação reúne escritos esparsos de Haroldo de Campos, publicados nos seus livros de ensaios e em suas traduções de poesia. A antologia cobre o âmago da poética da tradução desenvolvida por Haroldo de Campos. Organizado por Marcelo Tápia e Thelma Médici Nóbrega, o livro conta com dezesseis ensaios, publicados entre 1963 e 1997. A extensão temporal dos ensaios permite o acompanhamento do desenvolvimento da teoria de Haroldo de Campos da abolição da hierarquia entre criação e tradução poéticas. Apenas dois dos ensaios já integravam outras obras e foram incluídos para a manutenção da coesão do livro, que também conta com uma introdução elucidativa de Marcelo Tápia.

A reunião dos ensaios dimensiona a amplitude da busca pela existência sincrônica da obra como criativa e tradutória. Configura-se, assim, como cerne da discussão sobre recriação poética, atividade denominada por Haroldo de Campos transcriação: uma fonte indispensável e inesgotável de descoberta e diálogo fértil no trânsito entre línguas, linguagens, tempos e espaços.

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Literatura

Preciosidade historiográfica e literária

17 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Após dezoito anos esgotado no mercado editorial brasileiro, volta às livrarias o primoroso romance Mina R, de Roberto de Mello e Souza, (1921-2007), irmão do crítico literário Antonio Candido. O livro foi publicado no ano passado pela Ouro sobre Azul, fora editado em 1973 pela Duas Cidades e, em 1995, pela Record. A nova edição traz como apêndice quatro críticas elogiosas, escritas por Boris Schnaiderman – segundo quem, Mina R é “um livro cuja ausência em nossas livrarias, esses anos todos, era uma prova pungente de nossa miséria cultural” –, Berta Waldman, Giuseppe Carlo Rossi (especialista italiano em língua e literatura portuguesa e brasileira) e Manuel da Costa Pinto.

O livro destaca-se por sua desenvoltura literária e por ser uma das poucas obras de ficção sobre a Segunda Guerra Mundial. As situações e personagens do romance foram reinventados, porém com respaldo histórico baseado na própria vivência do autor, que integrou a Força Expedicionária Brasileira (FEB) e participou na Campanha da Itália em um batalhão encarregado de desarmar minas. A mina R que dá título ao livro é um tipo de artefato que continha 5 kg de dinamite e um poder de impacto de 180 kg, considerado na época como o mais perigoso de todos: o livro narra o enfrentamento do protagonista com essa arma letal. “Acho que quando você desarma mina a guerra fica sendo só sua e que cada mina é uma guerra que você ganha. Sozinho”, diz o narrador.

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história

Uma leitura histórico-social do texto literário

16 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

A leitura minuciosa de um conto, de um poema, de um romance, concentram em si sínteses históricas sob a pena erudita de Alfredo Bosi.

O livro Entre a literatura e a história, reúne cerca de quarenta textos, entre ensaios inéditos, entrevistas, prefácios e artigos de intervenção que versam sobre a literatura brasileira romântica, moderna e contemporânea, sobre as vanguardas latino-americanas, sobre Vico e também Leopardi. O volume conta ainda com uma série de textos em que Bosi revê etapas de sua própria formação, traçando o perfil de intelectuais como Otto Maria Carpeaux – sobre quem Bosi afirma ter seguido a esteira, examinando “as relações dialéticas entre ideologia e poesia e ideologia e narrativa, o que lhe abriu caminho para o seu conceito de literatura como resistência” –, Celso Furtado, entre outros, e discute questões contemporâneas, como, por exemplo, os desafios da educação no Brasil, ou a necessidade da poesia hoje: “A poesia seria hoje particularmente bem-vinda porque o mundo onde ela precisa subsistir tornou-se atravancado de objetos, atulhado de imagens, aturdido de informações, submerso em palavras, sinais e ruídos de toda parte”. A crítica literária e o pensamento sobre a literatura encaminham, assim, análises profundas, sobre a sociedade, sobre a história, enquanto trajeto e enquanto presente: uma leitura histórico-social do texto literário.

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matraca

Lúcido catastrofismo

15 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Fayga Ostrower – Litogravura

Em sua essência, a poesia é algo horrível:

nasce de nós uma coisa que não sabíamos que está dentro de nós,

e piscamos os olhos como se atrás de nós tivesse saltado um tigre,

e tivesse parado na luz, batendo a cauda sobre os quadris.”

– Czesław Miłosz, Ars Poetica.

 

 

A poesia de Czesław Miłosz é, a um só tempo, reflexiva e discursiva. Uma poesia que prima por uma disciplina clássica e pela exata objetivação da emoção lírica, mas que o faz através da ironia e da linguagem simples, oral. O poeta polonês consegue sintetizar a experiência humana com uma retórica que desafia as inconstâncias do diálogo interior e desmascara os mecanismos da manipulação política. Sua poesia é parte do mundo em que vive.

No Brasil, há uma antologia de suas poesias, publicada em 2003 pela Edunb, intitulada Não mais. A tradução foi feita por Marcelo Paiva de Souza e Henryk Siewiersk. Uma pequena porém rica coletânea bilíngüe – polonês-português –, que faz parte da série “Poetas do mundo”, que a Universidade de Brasília vem publicando para divulgar poetas relevantes e pouco traduzidos no Brasil. Em uma apresentação escrita sobre o livro, a professora Regina Przybycien, do curso de pós-graduação de letras da UFPR, fala sobre a introdução dos tradutores, na qual eles lembram “que Milosz é um poeta do concreto (não um poeta concreto), isto é, insere-se no grupo daqueles que “entendem o ofício poético como mimese e o praticam numa incessante perseguição do real” . A professora traça uma breve análise do poeta: “Paradoxalmente, talvez, para um poeta que não gosta de abstrações, os temas de Milosz são profundamente filosóficos (e às vezes teológicos) […]. Como poeta polonês do século XX, Milosz viveu a experiência das guerras, dos autoritarismos e do exílio (destino comum de grande parte dos intelectuais seus conterrâneos), experiências que marcam profundamente sua poesia, refletindo-se em temas como a tensão entre vida e arte: o efêmero e o horrível da vida contrastando com o permanente e o belo da arte. O poeta, no entanto, não glorifica facilmente a arte. […] Poeta do seu século e da sua cultura, Milosz tem os pés bem no chão, o chão minado da Europa Central com suas tragédias sangrentas”.

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Literatura

Felisberto Hernández e a fantasia poética

14 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

O uruguaio Felisberto Henández é um dos escritores mais originais da literatura ocidental. A editora Grua – cujo catálogo é excelente e ainda enxuto – publicou As hortênsias, em edição bilíngue, com tradução feita a quatro mãos por Pablo Cardellino Soto e Walter Carlos Costa. A tradução consegue com êxito verter para o português o “idioleto” felisbertiano, como analisa o poeta Ricardo Corona em artigo publicado no jornal O Estado de S.Paulo. Segundo Corona, “pode-se afirmar que suas histórias estão para a literatura fantástica como a prosa poética de Lautréamont (outro uruguaio) está para o surrealismo”; para ele, o leitor “ao ler o volume, perceberá que a revelação não passa pela ideia de que as histórias e personagens de Felisberto foram criadas para surpreender, mas talvez para permanecerem suspensas no inefável, nos acontecimentos em estado contínuo de poesia”. Nas palavras dos tradutores, “É um tipo de fantástico único, expresso em uma língua inconfundível”.

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Literatura

Dez novelas dentre as dez jornadas

13 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Il Decamerone di Messer Boccaccio – Ilustração de Tito Lessi

Giovanni Boccaccio é considerado o pai da prosa italiana moderna e sua obra Decameron é tida como uma das fundadoras da literatura ocidental moderna e responsável por inaugurar o formato de contos na tradição literária ocidental. Escrito originalmente em meados do século XIV, o livro é composto por cem narrativas, nas vozes de dez personagens – sete damas e três cavalheiros –, que as contam em meio a uma conversa distraída, para passar o tempo e celebrar suas vidas, enquanto recolhidos numa vila para fugir de um surto da peste negra, que então assolava Florença.

A editora Cosacnaify selecionou dez das narrativas com prefácio e tradução de Maurício Santana Dias e ilustrações de Alex Cerveny. A editora já tinha publicado uma novela do Decameron, em adaptação infanto-juvenil: Vingança em Veneza, com tradução de Nilson Moulin e ilustrações de Carlos Nine, é uma sátira sobre a sociedade em Veneza no século XIV; narra a história de um charlatão que consegue convencer uma bela dama que o anjo Gabriel estaria enamorado por ela e, encenando ele mesmo o papel do anjo, dorme com a moça diversas vezes até ser desmascarado.

Decameron é considerado um marco literário também por ser responsável por uma ruptura com a moral medieval; a obra de Boccaccio dá início ao registro de valores terrenos como responsáveis pela conduta humana. Ao contrário de seu contemporâneo, Dante, cujos mestres são Virgílio e Beatriz, cujo herói é um estudioso e cujo estilo é elevado, Boccaccio, no Decameron, retrata situações cotidianas e trava um diálogo paródico com a tradição. Ele Continue lendo

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matraca

Lamentável uniforme tecido pela incompreensão

10 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Frantz Fanon foi um dos mais relevantes pensadores da descolonização. Psiquiatra intelectualmente engajado na luta pela independência da Argélia, seus trabalhos analisam as psicopatologias da colonização e abordam, além dos aspectos propriamente psiquiátricos, também o viés sociológico e filosófico decorrente da vivência das atrocidades da guerra pela libertação.

Em Pele negra máscaras brancas, publicado no Brasil pela editora da Universidade Federal da Bahia, (EDUFBA) e traduzido por Renato da Silveira, Fanon examina a negação do racismo contra o negro na França, analisando um axioma que causou polêmica nas décadas de 1960 e 1970: como uma ideologia que ignora a cor pode apoiar o racismo que nega.

O indiano Homi K. Bhabha, importante teórico dos estudos pós-colonias (autor de O local da cultura, publicado pela editora da UFMG), no ensaio “Interrogando a identidade”, diz: “Ler Fanon é vivenciar a noção de divisão que prefigura – e fende – a emergência de um pensamento verdadeiramente radical que nunca vem à luz sem projetar uma obscuridade incerta. Fanon é o provedor da verdade transgressiva e transicional. […] Sua voz é ouvida de forma mais clara na virada subversiva de um termo familiar, no silêncio de uma ruptura repentina: O negro não é. Nem tampouco o branco”.

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Artes Plásticas

Passageiro de seu tempo

9 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Alberto Martins, Sem título, 1990, xilogravura

Alberto Martins espelhou, sob o título Em trânsito, o entroncamento da poesia e das artes plásticas na composição de sua poética artística. A primeira manifestação do título foi a exposição de gravuras e esculturas, cujo catálogo, Em trânsito foi publicado pela Pinacoteca em 2007. A segunda materialização foi o trabalho de poesias no livro também intitulado Em trânsito, publicado como livro pela Companhia das Letras em 2010. Ambos os livros, assim como ambos os trabalhos, traçam um trânsito artístico, cuja poética, longe de melancólica, mostra o “frescor de certos crepúsculos”, como define Francisco Alvim na orelha do livro de poesias.

Alberto Martins formou-se em Letras pela Universidade de São Paulo em 1981 e, no mesmo ano, começou a fazer gravuras, sob a orientação de Evandro Carlos Jardim, na mesma universidade. Em 2007 a Estação Pinacoteca apresentou “Em trânsito”, exposição retrospectiva que reuniu gravuras e esculturas produzidas desde 1987. Como escritor, Alberto publicou, entre outros, os livros Goeldi: história de horizonte, vencedor do prêmio Jabuti; A floresta e o estrangeiroCais, com xilogravuras do autor; A história dos ossos, segundo lugar no Prêmio Telecom de Literatura; A história de BirutaLívia e o Cemitério Africano e a peça de teatro Uma noite em cinco atos.

O livro de poemas Em trânsito consegue deter uma percepção contundente da passagem do tempo, da experiência humana inscrita na consciência constante de um compartilhamento alheio, sentimento de estar no mundo na companhia de uma multidão de desconhecidos.

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Literatura

Duas edições de bolso

8 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

A editora 34 acaba de lançar a edição de bolso da Odisseia, de Homero. Em 2011, a Companhia das Letras já havia lançado uma edição de bolso do épico, pela coleção que mantém em parceria com a editora inglesa Penguin. Como indica a popular substantivação do título, a obra permanece próxima a características humanas atemporais e sua narrativa é reconhecida pelo senso comum como parte fundamental de toda a literatura ocidental. É justamente por isso que a publicação em edições de bolso, portáteis e economicamente mais acessíveis, é de grande valia para seu acesso mais amplo; a edição mais simples inclusive desmistifica em certa medida a leitura da obra, cuja relevância histórica e literária, bem como a forma em poesia épica, são tomados como responsabilidades intelectuais primeiras e, por si sós, já inibem sua leitura de antemão.

A versão da Penguin-Companhia das Letras vem com um “guia de leitura” ao final, com algumas questões de verificação de compreensão acerca de alguns episódios, com respectivas respostas, além de uma seleção bibliográfica recomendada à guisa de comentário – dois livros publicados nos Estados Unidos, dois na Inglaterra e um em Portugal. A edição conta com introdução e notas escritas pelo falecido professor inglês Bernard Knox, estudioso dos textos da Grécia Antiga, debruçou-se durante a carreira acadêmica principalmente sobre a obra de Sófocles e foi diretor e fundador do Centro de Estudos Helênicos da Universidade de Harvard. A tradução desta edição foi feita pelo português Frederico Lourenço, também responsável pelo prefácio. A editora disponibiliza trecho do Canto I em seu site.

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Literatura

Agudas memórias

7 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Ivan Turguêniev, conhecido especialmente por seu romance Pais e filhos, nasceu em 1818, em Oriol, na Rússia. Aos vinte anos, mudou-se para Berlim, onde estudou filosofia, letras clássicas e história. Pouco depois, em 1843, conheceu o grande crítico literário Bielínski e, influenciado por suas ideias, publicou contos inspirados pela estética da Escola Natural, depois reunidos em Memórias de um caçador, coletânea que, publicada originalmente em 1852, obteve enorme sucesso na Rússia e na Europa. O volume agora é lançado no Brasil, com tradução de Irineu Franco Perpetuo em edição cuidadosa da Editora 34. O conjunto dos contos é reconhecido como um dos mais profundos e tocantes retratos da antiga Rússia. Sua denúncia, sutil, porém contundente, da injustiça da servidão acabou por representar-se fundamental no processo de emancipação dos servos, em 1861, o episódio mais importante da história russa do século 19. Conforme diz o tradutor no posfácio, após a publicação do livro o censor moscovita, a quem o autor submetera o manuscrito justamente por saber da menor rigidez daquele em relação aos censores de São Petersburgo, perdeu o emprego; Turguêniev, por sua vez, foi condenado a um mês de prisão domiciliar em Spásskoie.

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matraca

Lirismo dessacralizante

6 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

A poeta Ana Cristina César teve uma vida breve. Foi, ainda assim, uma das mais importantes representantes da poesia marginal que florescia na década de 1970. Deixou uma obra híbrida de prosa e poesia, equilibrada entre o ficcional e o autobiográfico. Apesar de identificada à poesia marginal, sua lírica é independente, dessacralizante, espontânea: Ana Cristina César reverte os procedimentos comuns ao grupo e critica-os a partir de seu próprio âmago. Seu espaço literário simula o discurso confessional a partir de falsas correspondências e diários, alcança o tom coloquial parodiando textos da tradição literária. Além de poeta, foi também ensaísta e tradutora. Desde a vida universitária, participou ativamente da cena cultural carioca e do movimento da poesia marginal, conviveu com poetas como Cacaso (1944 – 1987) e intelectuais como Heloísa Buarque de Holanda (1939). Colaborou em diversas publicações, com destaque para Beijo, importante periódico de cultura, com sete números impressos, cujo processo ela acompanhou desde a criação. Suicidou-se aos trinta e um anos – atirou-se pela janela do apartamento dos pais, no oitavo andar de um edifício da rua Tonelero, em Copacabana. Sua obra estava há décadas fora de catálogo e, agora adquirida pela Companhia das Letras, volta a ser publicada, num volume único que compila desde os volumes independentes do começo da carreira aos livros póstumos: Poética reúne Cenas de abril, Correspondência completaLuvas de pelicaA teus pésInéditos e dispersosAntigos e soltos, uma seção de poemas inéditos. A edição ainda conta com texto de posfácio escrito pela professora Viviana Bosi e um farto apêndice. A curadoria editorial e a apresentação couberam ao também poeta, grande amigo e depositário da obra de Ana Cristina, Armando Freitas Filho.

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matraca

A palavra afiada de Gilda

3 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

Previsto para ser lançando em 2013, mas ainda no prelo, A palavra afiada, será um volume com entrevistas e textos da filósofa, crítica literária, ensaísta e professora emérita da USP, Gilda de Mello e Sousa (1919 – 2005).

O livro, editado pela Ouro sobre Azul, é organizado por Walnice Nogueira Galvão, professora titular de literatura na Universidade de São Paulo. Segundo Walnice, em entrevista à revista Cult, Gilda produziu uma “reflexão finíssima, perspicaz e aguda sobre diferentes fenômenos artísticos, estéticos”.

Gilda foi casada com o crítico Antonio Candido, com quem colaborou na produção da revista acadêmica Clima, publicada entre 1941 e 1944, marco da vida intelectual brasileira, cujo corpo editorial era também composto pelos amigos Paulo Emilio Salles Gomes, Décio de Almeida Prado, Ruy Coelho, Lourival Gomes Machado e Alfredo Mesquita, entre outros. Formou-se em filosofia pela Universidade de São Paulo, onde teve aulas com Claude Lévi-Strauss, Roger Bastide e Jean Maugüé e onde recebeu o título de doutora em ciências sociais com a tese A Moda no Século XIX. De 1943 a 1954, foi assistente de Roger Bastide na cadeira de Sociologia da mesma universidade e, a partir de 1955, tornou-se professora de Estética no Departamento de Filosofia, cuja direção viria a assumir nos anos difíceis da ditadura militar. Nesse departamento fundou, em 1970, a revista Discurso, até hoje uma referência nos estudos filosóficos brasileiros. Aposentou-se em 1972 e recebeu, em 1999, o título de professora emérita da USP. Continue lendo

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Literatura

A erudição da experiência literária

2 janeiro, 2014 | Por Isabela Gaglianone

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A erudição de Erich Auerbach traduz-se na abrangência e clareza quase artística de suas análises críticas literárias, cuja contribuição passa pela sociologia da literatura, pela escrita da história e principalmente pelos estudos filológicos, amparados, esses, pela filosofia e pela história das ideias. Auerbach é uma das mais significativas referências nos estudos de caráter hermenêutico e de exegese literária do Ocidente e indagam o âmago da experiência humana histórica. Seu legado intelectual perpetua-se intensamente presente com o passar das gerações acadêmicas.

Em Ensaios de literatura ocidental, publicado pela editora 34, com organização de Davi Arrigucci Jr. e Samuel Titan Jr. e traduzido por Samuel Titan Jr. e José Marcos Mariani de Macedo, são reunidos quinze estudos publicados entre 1927 e 1954, quase todos inéditos em português. São ensaios dedicados às perspectivas dos estudos literários e do humanismo no contexto da cultura globalizada, à ideia cristã de “estilo humilde”, às obras de Dante e Vico, à literatura francesa de Montaigne a Proust, passando por Pascal, Rousseau, Racine e Baudelaire. Continue lendo

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fotografia

Mais que uma catalogação de fôlego

23 dezembro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

Vencedor do prêmio Jabuti deste ano, na categoria de Artes e Fotografia, o livro Estou Aqui. Sempre Estive. Sempre Estarei: Indígenas do Brasil suas Imagens (1505-1955), de Carlos Eugênio Marcondes de Moura apresenta uma vasta pesquisa iconográfica da pintura e dos grafismos dos grupos indígenas brasileiros. Publicado pela Editora da Universidade de São Paulo, o livro mostra como as cores, símbolos ou imagens foram por diferentes tribos aplicadas em diversos suportes, como pedra, cerâmica, cascas ou mesmo papel e, com frequência, no corpo humano.

A pintura indígena foi desde os primórdios da colonização relatada por cronistas, retratada por pintores e por viajantes, mas é historicamente recente sua compreensão antropológica e sociológica enquanto fundamentais manifestações simbólicas, estéticas e inclusive políticas nas vidas tribais. As imagens do livro são compostas também de pinturas sobre tela, desenhos, aquarelas, gravuras, litografias, esculturas e fotografia dos grafismos indígenas – reproduções de obras de artistas viajantes e naturalistas, que estiveram no Brasil em diferentes épocas, entre eles, os desenhistas da expedição comandada pelo jovem naturalista baiano Alexandre Rodrigues Ferreira, a conhecida Viagem Filosófica, que durou cerca de oito anos e percorreu parte da Amazônia e do Mato Grosso.

O livro conta com ensaios que analisam e demonstram como, nos contextos tribais, a arte funciona como meio de comunicação, expressão de categorias sociais e materiais, manifestações ritualísticas e mensagens referentes à ordem cósmica. Uma interessante introdução do autor contextualiza a iconografia e a edição conta também com prefácio escrito pela antropóloga Betty Mindlin.

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matraca

Pasquim político

20 dezembro, 2013 | Por Isabela Gaglianone

O semanário político O Homem do Povo foi publicado entre março e abril de 1931. O jornal, fundado por Oswald de Andrade e sua então mulher Patrícia Galvão, a Pagu, após terem filiado-se ao Partido Comunista do Brasil, foi uma resposta militante, cujo objetivo era espalhar a mensagem da revolução entre o operariado urbano – à politicamente conturbada época de disputa entre extremas direita e esquerda, representadas respectivamente pelo nazifascismo europeu e pelo bolchevismo soviético. Hiperbólico, provocativo, crítico e satírico, o jornal aliou o humor irreverente de Oswald a uma reflexão crítica de sua própria participação no modernismo. O efêmero periódico, assim, caracterizou-se, em seus aspectos político e estético, pela militância política desenvolvida numa linguagem expressiva e comunicativa, uma escrita cheia de ironias, paradoxos, trocadilhos.

A Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, em coedição com a editora Globo e com apoio do Museu Lasar Segall, publicou a coleção integral dos exemplares fac-símile do jornal. A edição traz também textos explicativos, escritos por Augusto de Campos, Maria de Lurdes Eleutério e Geraldo Galvão Ferraz – filho de Pagu.

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